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Com 'O Preço do Prazer', Polônia se firma como referência do cinema erótico
Com um histórico marcado por Walerian Borowczyk, cinema polonês ganha força no nicho e vai além com 'O Preço do Prazer'
Matheus Mans | 11/10/2023 às 13:52 - Atualizado em: 11/10/2023 às 13:52
Depois do sucesso de 50 Tons de Cinza nos cinemas, era esperado que um novo nicho de filme ganhasse fôlego no audiovisual: o cinema erótico. São filmes que seguem o mesmo estilo das histórias de Mr. Grey, em que há sugestão sexual em tramas de drama e o thriller. Mas, ao contrário do que se esperava, não foi Hollywood que abocanhou esse mercado, mas sim a Polônia. O país está por trás de 365 dni e O Preço do Prazer, estreia desta semana no streaming.
Enquanto 50 Tons falava de sadomasoquismo, mas sem nunca abraçar o mundo do fetiche de fato, as produções polonesas contam com um desprendimento curioso de assistir. Começando com 365 dni, primeiro filme erótico de sucesso do país e que estreou na Netflix, os filmes poloneses eróticos abraçam os temas mais espinhosos possíveis. Além disso, cenas de sexo e de nudez surgem com mais naturalidade. A conversa sobre sexo é mais franca por aqui.
Isso fica mais evidente com o novo O Preço do Prazer. O longa-metragem, que está disponível para compra e aluguel nas plataformas de streaming, toca em um assunto polêmico: baseada no livro Girls from Dubai, de Piotr Krysiak, a história gira em torno do mercado sexual da cidade oriental, um mundo repleto de luxo, prazer, poder, ambição e corpos perfeitos. Em foco está a jovem Emi, que há anos sonha em fazer parte do exclusivo mundo do luxo. Logo se torna uma acompanhante VIP e, depois, começa a recrutar moças, celebridades, estrelas da tela e modelos polonesas.

Toda essa história é baseado na polêmica real do chamado “Dubai scandal”, no que celebridades polonesas que exerceram prostituição na cidade árabe. Com isso, o longa-metragem conseguiu chamar a atenção na Polônia: se tornou a maior estreia de um filme local em 2021, acumulando 278 mil ingressos vendidos (via CineEuropa). Ainda assim, apesar do sucesso, o filme acabou sendo banido da Arábia Saudita para evitar que a história voltasse por lá.
Cinema erótico polonês: qual a história desse mercado?
Apesar do sucesso atual desses filmes já citados, a relação do cinema polonês com o sexo vem dos anos 1970. Nessa época, o cineasta Walerian Borowczyk chocou a sociedade polonesa com o filme O Monstro, longa-metragem assumidamente erótico. Na história, uma família nobre com problemas econômicos espera ansiosamente pela chegada de Lucy Broadhurst, filha de um rico burguês que vai se casar com o excêntrico Mathrin. Mas, quando a garota chega ao local, fica muito interessada pelas histórias de Romilda de l'Espérance, uma antepassada de seu futuro marido.
Foi um sucesso naquela época, com a sociedade chocada, mas sempre comentando o filme. Foi o início de uma série de produções eróticas de Borowczyk: Atrás dos Muros do Convento, História de um Pecado, A Margem e por aí vai.
O sucesso de Borowczyk, que pode ser até comparado com o que aconteceu no Brasil com as pornochanchadas, acabou ficando preso ali nos anos 1970. Apesar de desenvolver o cinema erótico com tramas apimentadas e muitas vezes até chocantes, como aconteceu com o ousado Atrás dos Muros do Convento, a sensação é de que esse cinema não evoluiu de verdade. Até mesmo por conta de instabilidades políticas, o sexto se tornou um tabu na Polônia.
O Preço do Prazer e o cinema erótico polonês moderno
Esses tabus voltaram à pauta no início dos anos 2010. Mesmo com esse passado pulsante, com Borowczyk na memória, cineastas -- principalmente mulheres -- começaram a comandar um cinema que fala (ainda que nem sempre mostre) sobre sexo. É o caso do filme franco-polonês Elles, com Juliette Binoche interpretando uma jornalista que está escrevendo um artigo para uma revista sobre estudantes que se prostituem. A diretora polonesa Malgorzata Szumowska fala muito sobre o mercado do sexo, mas há pouquíssima exposição, ficando ainda refém desse tabu.
Parece que há uma vergonha no ar, com os diretores reproduzindo seus medos em cena. É o caso do curta-metragem Users, de Jakub Piątka, em que cenas de nudez ficam à sombra, ou Into the Spiral, de Konrad Aksinowicz , que conta com uma cena de relação sexual fria e crua, talvez a mais forte desde Borowczyk, mas com pouquíssima naturalidade.

E é aí que chega Maria Sadowska. A cineasta, por trás de O Preço do Prazer, ainda conta com algumas amarras da sociedade polonesa, como o medo de mostrar "algo a mais" em cenas mais quentes. Ainda assim, ela adotou o erotismo como uma forma de chocar e se aproximar do público. Isso surge mais fortemente em A Arte de Amar, em que fala sobre Michalina Wislocka, a mais famosa e renomada sexóloga da Polônia comunista e que luta pelo direito de publicar seu livro, que mudará para sempre a vida sexual dos poloneses -- preocupação que resiste até hoje.
Agora, com seu novo filme, ela vai alguns passos além e traz essa provocação não apenas sobre o sexo na sociedade polonesa, mas também sobre as ramificações desse mercado sexual ao redor do mundo. É um passo além do que fez 365 dni, um filme com pouquíssimo a dizer. Aqui, Sadowska não apenas provoca, como também faz pensar: até que ponto vai o cinema erótico polonês? Qual o limite? O sexo está ali não apenas pelo choque, mas para descortinar o que acontece nos bastidores, em uma sociedade que, nos últimos anos, exagerou no pudor. Há espaço pra mais?
Ela não responde nada disso, mas traz dúvidas. E nós, o público, ficamos de olho com o que pode acontecer nos próximos passos com a diretora e o novo cinema erótico polonês, que, aos poucos, deixa de ser apenas algo plástico para chocar e passa a contar histórias de verdade e a fazer pensar, colocando a produção do país em outro patamar.
O Preço do Prazer já está disponível para compra e aluguel. Clique aqui para assistir ao filme.
Jornalista especializado em cultura, gastronomia e tecnologia, cobrindo essas áreas desde 2015 em veículos como Estadão, UOL, Yahoo e grandes sites. Já participou de júris de festivais e hoje é membro votante da On-line Film Critics Society. Hoje, é editor do Filmelier.
Jornalista especializado em cultura, gastronomia e tecnologia, cobrindo essas áreas desde 2015 em veículos como Estadão, UOL, Yahoo e grandes sites. Já participou de júris de festivais e hoje é membro votante da On-line Film Critics Society. Hoje, é editor do Filmelier.
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