Com ‘Destacamento Blood’, Spike Lee coloca Guerra do Vietnã sob nova perspectiva Com ‘Destacamento Blood’, Spike Lee coloca Guerra do Vietnã sob nova perspectiva

Com ‘Destacamento Blood’, Spike Lee coloca Guerra do Vietnã sob nova perspectiva

No novo filme da Netflix, o cineasta faz paralelos entre um grupo de soldados negros com a situação do povo periférico nos Estados Unidos

Matheus Mans   |  
12 de junho de 2020 08:32
- Atualizado em 17 de junho de 2020 16:51

Nas últimas semanas, com o assassinato de George Floyd, o mundo entrou em ebulição. Marchas antirracistas e antifascistas tomaram conta do mundo. Assim, criou-se um movimento de ressignificação da cultura e de momentos históricos. No Brasil, Borba Gato entrou na mira. Nos EUA, o clássico ‘…E o Vento Levou’. No novo filme do Spike Lee, a Guerra do Vietnã.

Em ‘Destacamento Blood‘, longa-metragem que chega hoje, 12, ao catálogo da Netflix, o cineasta coloca sua linguagem e seu ponto de vista sobre o conflito que durou entre os anos 1950 e 1970. Afinal, por mais que o diretor Francis Ford Coppola tenha eternizado os horrores da guerra em ‘Apocalypse Now’, nunca houve antes uma preocupação sobre o povo negro.

Ressignificação do Vietnã

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É isso que Lee tenta trazer no filme. Assim, com uma narrativa descentralizada, o responsável por títulos como ‘Faça a Coisa Certa’ e ‘Malcolm X‘ traça paralelos entre os soldados negros no conflito asiático com a situação do povo periférico americano. Em terras vietnamitas, negros eram 1/3 do total de soldados. Lutavam por seu país. E morriam por isso.

Enquanto isso, do outro lado do globo, negros eram mortos por policiais. Ou seja: representantes do governo. De uma forma ou de outra, o povo periférico e marginalizado, neste período, estava morrendo de “forma oficial”. Lee volta a hastear suas bandeiras e a deixar clara a indignação sobre essa situação, que perdura até hoje, e a escancarar essas suas dores.

Spike Lee nos bastidores de ‘Destacamento Blood’ (Crédito: Divulgação/Netflix)

“As cicatrizes psicológicas da Guerra do Vietnã são palpáveis ​​na comunidade negra. Há desemprego e falta de moradia”, diz o material de apresentação do filme, divulgado pela Netflix. “Aqueles que tiveram a sorte de retornar aos Estados Unidos tinham que lutar contra seu governo — o mesmo que acabaram de defender no exterior — por Direitos Civis básicos”.

De novo, Lee consegue sentir os anseios e as dores de um população. Afinal, ‘Destacamento Blood’ foi rodado muito tempo antes desse movimento de ressignificação que percorre o mundo. Lee se antecipou. O mesmo ocorreu em ‘Faça a Coisa Certa’, por exemplo, que conta com uma cena que dialoga diretamente com a violência policial que vemos ainda nos dias de hoje.

História de ‘Destacamento Blood’

Assim, para embalar todo esse sentimento externado por Lee, o longa-metragem se debruça sobre a figura de quatro veteranos afro-americanos — Paul, Otis, Eddie e Melvin — que retornam ao Vietnã para procurar pelos restos mortais do líder de seu esquadrão. Além disso, há uma promessa de que na região existe um tesouro enterrado e que pode mudar suas vidas.

No entanto, o retorno ao campo de batalha revive antigas dores. Afinal, além da jornada tortuosa para encontrar o tesouro, eles precisarão lidar com questionamentos além das telas. Falam sobre direitos humanos, violência policial, fascismo. E são personagens extremamente diversos. Há um politizado, outro mais desligado. E até um eleitor de Donald Trump.

A ideia, assim, é criar um cenário rico, plural, real. Não só sobre o conflito em si. Mas sobre seus efeitos e suas cicatrizes. Afinal, parafraseando Francis Ford Coppola sobre ‘Apocalypse Now’, este não é um filme sobre a comunidade negra na Guerra do Vietnã, apenas. É um filme sobre a comunidade negra. Sobre a origem de suas dores. E sobre o seu futuro.