Qual é o processo de qualificação de um filme para o Oscar? Qual é o processo de qualificação de um filme para o Oscar?

Qual é o processo de qualificação de um filme para o Oscar?

É um caminho cheio de regras para que a Academia garanta que apenas filmes pensados e lançados para os cinemas participem da premiação

12 de janeiro de 2024 23:26
- Atualizado em 16 de janeiro de 2024 13:11

Em 2020, ‘A Vida Invisível’, do diretor Karim Aïnouz, foi o selecionado do Brasil para concorrer ao Oscar. Porém, na lista de indicados pintou uma outra produção nacional, o documentário ‘Democracia em Vertigem’, de Petra Costa.

Já em 2021, ‘Bacurau‘, que nunca foi o selecionado brasileiro para a premiação, apareceu como elegível ao Oscar.

Com esses dois fatos, certamente muita gente ficou na dúvida: como é decidido qual filme pode entrar ou não na disputa pelo maior prêmio do cinema mundial?

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Como mais um dos artigos especiais do Filmelier sobre o Academy Awards, vamos explicar qual é o processo de seleção para a premiação – que pode variar de uma categoria para outra. Desde 2021, por conta da pandemia, também estão valendo regras especiais, abrindo caminho para a presença do streaming na maior premiação do cinema mundial.

Artigos da série:

– O que é a Academia e quem vota no Oscar?
– Como começou o Oscar?
Como são escolhidos os indicados e vencedores do Oscar?
– Como é por dentro do Dolby Theatre, a casa do Oscar?
– As verdades (nada) secretas do Oscar

De acordo com a Academia de Artes e Ciência Cinematográficas, para um filme concorrer ao Oscar do ano seguinte ele precisa ter estreado nos cinemas entre à meia-noite de 1º de janeiro e às 23h59 de 31 de dezembro do ano corrente. Isso vale para todas as categorias.

Por regulamento, ainda que nem sempre seja o que acontece na prática, o Oscar elege os melhores filmes do ano anterior.

Para concorrer ao Oscar, um filme precisa passar no cinema
Chinese Theatre, em Hollywood: todos os filmes exibidos aqui (como em todos os cinemas de LA) se qualificam para o Oscar (crédito: Tim Wang/Flickr)

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Para as principais categorias entre os longas-metragens (incluindo Melhor Filme, Direção, as de atuação, técnicas, entre outras), as regras são as mesmas. Além de ter sido lançado no ano anterior, o longa precisa ser exibido comercialmente (ou seja, com venda de ingressos) por sete dias consecutivos em qualquer cinema do Condado de Los Angeles (que, além de LA, compreende cidades como Santa Monica, Beverly Hills, Burbank e Long Beach), sendo pelo menos três exibições diárias com uma obrigatoriamente entre 18h e 22h. Os horários precisam ser divulgados pela imprensa. 

São considerados longas os filmes com mais de 40 minutos, e a Academia ainda define critérios técnicos – “exibição pública”, diz a AMPAS, “significa filme de 35mm ou 70mm, ou formato de cinema digital de 24 ou 48 frames por segundo progressive scan, com um projetor de resolução mínima de 2048 por 1080 pixels”, entre outros pormenores – que incluem até áudio 5.1 ou 7.1.

Não vale só exibir
filme no telão:
até o projetor conta

Não são aceitos filmes exibidos anteriormente em outros meios antes da projeção na tela grande. Ou seja, um original Netflix não pode ser lançado primeiro na plataforma e só depois ir aos cinemas, caso a empresa queira que ele seja elegível à premiação. Porém, lançamentos no mesmo dia no streaming e nos cinemas (o famoso “day and date”) são permitidos. 

Claro que, com tudo isso, nos últimos surgiu uma polêmica sobre a elegibilidade de filmes para o streaming, muito por conta do avanço da Netflix na premiação. A empresa passou a lançar suas maiores apostas nos cinemas e, depois de ouvir críticas, a garantir uma janela de algumas semanas de exclusividade na tela grande. Foi o que aconteceu com ‘O Ataque dos Cães’, lançado nos cinemas em 17 de novembro de 2021 e no video on demand em 1º de dezembro.

Além de todo o trabalho cumprir os requisitos necessários, os produtores do filme precisam preencher uma inscrição à ser enviado para a Academia, com todos os créditos de quem trabalhou no filme, o cinema onde foi exibido, as datas e tudo mais. 

Pior: o The Hollywood Reporter indicou que novos regras podem começar a valer a partir de 2024, endurecendo essas exigências. Se entrarem em vigor, filmes que quiserem concorrer a premiação deverão ficar em cartaz por mais sete dias e em ao menos 10 das maiores cidades dos EUA. A expansão da exibição não precisa ser logo após a primeira semana de estreia, mas terá que acontecer dentro de 45 dias após o lançamento original.

Além disso, a Academia também exigirá informações prévias sobre distribuição das produtoras que desejarem lançar filmes em fim de ano. O intuito, segundo a Academia, é aumentar a visibilidade de filmes.

As categorias diferenciadas

Algumas categorias possuem critérios diferentes de elegibilidade, principalmente naquelas que possuem naturalmente um mercado menor de público (e de exibição), ou que necessitam de explicações mais detalhadas sobre seu formato.

Paris Theatre, arrendado pela Netflix: espaço pode qualificar documentários (Crédito: divulgação/Netflix)

No caso dos documentários, os longas ou curtas devem ter ficado em cartaz (com cobrança de ingresso) por sete dias consecutivos nos cinemas do Condado de Los Angeles ou da Cidade de Nova York – ou ainda ser premiado em um festival que qualifica o título ao Oscar, como Cannes, Berlim e Cartagena. Também não pode entrar um documentário que foi exibido ou premiado em festival qualificatório dois anos após ser completado. 

Documentário
de quase 8h?
No Oscar isso existe

Séries documentais não entram no Oscar, o que levou a alguns acontecimentos curiosos. ‘O.J.: Made in America’, vencedor em 2017, tem nada menos que 7h e 47 minutos de duração na versão para os cinemas, já que não pode ser “quebrado” em múltiplas partes (na TV são cinco capítulos). Tudo em busca de uma “brecha” no regulamento.

Entre os desenhos animados, por exemplo, a Academia afirma que artifícios como a captura de movimentos, como foi feito em produções como ‘O Rei Leão’ e ‘As Aventuras de Tintim’, “não são, por si só, técnicas de animação” – e é preciso provar que há o emprego de algum tipo de animação quadro a quadro. São aceitos métodos como animação computadorizada, stop-motion, e desenhos feito a mão – e que pelo menos 75% do longa ou curta deve ser animado. 

‘As Aventuras de Tintim’ foi considerado uma animação pela Academia – mesmo usando captura de movimentos (crédito: divulgação/Sony Pictures)

Entre os curtas animados e live action (ou seja, com atores de carne e osso), a duração máxima não pode passar de 40 minutos. O critério de exibição é parecido com o dos documentários: sete dias consecutivos em LA ou Nova York, ter sido premiado em um festival qualificatório ou ter recebido as medalhas de ouro, prata ou bronze no Student Academy Awards, organizado pela própria Academia. 

São excluídos, por motivos óbvios, peças publicitárias, ou aquilo que tenha estreado (em um ano normal) na TV, DVD ou VOD antes de ser exibido nos cinemas. 

Regras especiais na pandemia

Vale lembrar que muitas regras mudaram durante a pandemia — mas não são regras, foram apenas exceções. Por conta do momento complicado no mercado exibidor e da indústria do cinema, a Academia adotou uma série de permissões. Por isso, excepcionalmente, aceitou filmes que foram lançados direto no video on demand, mas que, antes, estavam planejados para serem exibidos nos cinemas.

'Luca': mesmo lançado direto no Disney+, o filme da Pixar foi indicado ao Oscar 2022 (crédito: reprodução / Disney)
‘Luca’: mesmo lançado direto no Disney+, o filme da Pixar foi indicado ao Oscar 2022 (crédito: reprodução / Disney)

Os outros critérios de elegibilidade continuaram valendo, porém. E, caso o cineasta ainda insistisse em lançar o seu longa-metragem na tela grande, a instituição passou a aceitar mais praças além do condado de Los Angeles: foi necessária a exibição em pelo menos uma das “grandes 6 áreas metropolitanas” dos EUA, incluindo Nova York, Miami e Atlanta. Até os drive-ins, que antes não eram qualificatórios, passaram a valer.

Os filmes estrangeiros

Há, ainda, uma forma de se qualificar para o Oscar sem ter tido um lançamento comercial nos EUA – e é justamente via a categoria de Melhor Filme Internacional, que desde 2020 substitui a categoria de de Melhor Filme em Língua Estrangeira (popularmente conhecida como “Filme Estrangeiro”).

Nesse caso as produções precisam estrear em seu país de origem entre 1º de outubro e 30 de setembro do ano seguinte, para se qualificar ao Oscar do ano posterior – com exibição por pelo menos sete dias consecutivos com cobrança de ingressos. Ou seja, se um filme estreou em 5 de outubro de 2020 e ficou uma semana em cartaz, ele foi elegível ao Oscar 2022. Não acaba aí: não pode ocorrer o lançamento em outros meios antes do cinema e, claro, produções norte-americanos não podem concorrer (além da maior parte dos diálogos precisarem ser em outro língua que não o inglês). 

Filme estrangeiro:
a forma do Oscar
envolver o resto
do mundo

Apenas um filme por país é admitido, em uma seleção que é feita por um órgão, comitê ou júri local – no Brasil, quem cuida disso é a Academia Brasileira de Cinema. Depois de selecionado, os materiais do longa precisam ser enviados para a Academia até 1º de outubro. Por mais que seja normalmente o diretor que receba a estatueta, este é um prêmio para o país (como um todo) que submeteu o longa-metragem.

Vale mencionar que houve uma mudança recente na regra da categoria, que passou não só a aceitar documentários, como eles se tornam elegíveis também a categoria de Melhor Documentário. Em 2020 isso ajudou ‘Honeyland’, que foi indicado nas duas categorias. 

Fernanda Montenegro no Oscar de 1999: você acredita que quem ganhou foi a Gwyneth Paltrow? (crédito: reproduçao/AMPAS)

É bom ressaltar que um filme pode ter sido lançado nos EUA e ainda concorrer ao Oscar de Filme Internacional/Estrangeiro. Foi o que aconteceu, por exemplo, com ‘Central do Brasil’, que ficou em cartaz em Los Angeles, se qualificou para as outras categorias e rendeu uma indicação à Fernanda Montenegro.

‘A Vida Invisível’, ‘Democracia em Vertigem’ e ‘Bacurau’

Como você deve estar imaginando agora, ‘A Vida Invisível’ se qualificou para o Oscar 2020 por ter sido a escolha do Brasil para a premiação – e acabou não indicado. ‘Parasita’ levou estatueta de Melhor Filme Internacional (e a de Melhor Filme).

Já ‘Democracia em Vertigem’ passou por um processo totalmente diferente. O documentário da Netflix teve lançamento limitado nos cinemas dos Estados Unidos em junho passado, qualificando-se pela exibição em Los Angeles e/ou Nova York. 

Por fim, ‘Bacurau’ entrou em um caso parecido com o de ‘Democracia em Vertigem’: se qualificou para a premiação em 2021 pela exibição nos EUA. No entanto, não foi nos cinemas: o longa brasileiro foi lançado nos chamados “cinemas virtuais”, como o Kino Marquee – iniciativa dos exibidores para contornar o fechamento das salas físicas.

O caminho, de acordo com as regras especiais na pandemia, foi válido. No entanto, ‘Bacurau’ não balançou o coração dos membros da Academia e, por mais que estivesse qualificado, não foi indicado.

Próximos artigos da série:

Como são escolhidos os indicados e vencedores do Oscar?
Como é por dentro do Dolby Theatre, a casa do Oscar?
As verdades (nada) secretas do Oscar

Matéria originalmente publicada em 22 de janeiro de 2020 e atualizada em 12 de janeiro de 2024.

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