‘Vou Morrer Amanhã’ e a outra grande pandemia do século: a da ansiedade ‘Vou Morrer Amanhã’ e a outra grande pandemia do século: a da ansiedade

‘Vou Morrer Amanhã’ e a outra grande pandemia do século: a da ansiedade

Escrito e dirigido por Amy Seimetz, atriz de ‘Stranger Things’, o filme acaba de ser lançado no streaming e é uma alegoria pandêmica para falar de transtornos psiquiátricos

19 de fevereiro de 2021 09:34
- Atualizado em 22 de fevereiro de 2021 17:13

Ansiedade, depressão e outros transtornos são os temas de ‘Vou Morrer Amanhã’, filme que acaba de ficar disponível para assistir online no Brasil. A obra de Amy Seimetz (atriz de ‘Stranger Things’ e diretora de ‘Sun Don’t Shine’) é experimental, ousada e intrigante por conseguir tratar de questões mentais de uma forma diferente. Em entrevista exclusiva ao Filmelier, a cineasta contou mais sobre sobre a produção.

No entanto, esse bate-papo foi um pouco diferente do habitual, fazendo emergir todas as inseguranças da diretora – algo trouxe um sentido ainda mais profundo para o longa-metragem.

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Antes de entrevistar alguém, seja ao vivo ou por telefone, eu, Raíssa, geralmente fico ansiosa – e achava que isso era uma coisa apenas minha. No entanto, ao falar com Amy Seimetz, não só percebi que essa ansiedade pode acontecer do lado da entrevistada, como ela própria confessou toda a sua inquietação.

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De certo modo, o jeito dela me acalmou e se transformou em um grande gancho para falar de ‘Vou Morrer Amanhã’, que tem como premissa uma pandemia psicológica de… ansiedade.

Kate Lyn Sheil dá vida à Amy em Vou Morrer Amanhã (Foto: divulgação / Synapse Distribution)
Kate Lyn Sheil dá vida à Amy em ‘Vou Morrer Amanhã’ (Foto: divulgação / Synapse Distribution)

Na história, a protagonista, que também se chama Amy, tem a plena convicção de que vai morrer no dia seguinte e, assim que conta isso pra alguém, automaticamente passa esse sentimento adiante. A ideia se assemelha ao terror ‘Corrente do Mal’, em que uma maldição é transmitida pelo sexo, fazendo uma alegoria a doenças sexualmente transmissíveis.

Pandemia psicológica

O roteiro, também escrito por Seimetz, foi baseado nos transtornos psiquiátricos da cineasta. “[A ideia surgiu] da minha própria ansiedade, minha ansiedade diária, do meu pavor existencial que é compartilhado com meus amigos. O mesmo aconteceu quando comentei com meus amigos sobre esta ligação, eu os puxei para dentro da minha ansiedade e espalhei isso, o mesmo acontece com outras coisas sombrias como o medo”, explica a americana.

“Eu comecei a rir de mim quando tive essa ideia, mas achei que fosse interessante para fazer um filme. Além disso, eu sou viciada em notícias, simplesmente não me canso. Eu estava assistindo a um noticiário e as informações contidas nele vão se espalhando como um incêndio. Partindo deste princípio, as ideias baseadas no medo também se disseminam como fogo e tem consequências reais na vida das outras pessoas”.

‘Vou Morrer Amanhã’ também traz uma reflexão sobre relacionamentos – muitas vezes carregamos os medos, anseios e inseguranças das pessoas do qual nos envolvemos, de forma voluntária e involuntária.

“Traumas e transtornos mentais muitas vezes são doenças genéticas, costuma ser passado de geração para geração e você acaba trazendo isso para seus relacionamentos, afetando todos que conhece”, conta Amy Seimetz. “É como a essência daquele ditado: enquanto você não curar as feridas, você vai sangrar em pessoas que não te machucaram”.

A atriz Michelle Rodriguez faz uma participação especial em Vou Morrer Amanhã (Foto: divulgação / Synapse Distribution)
A atriz Michelle Rodriguez faz uma participação especial em ‘Vou Morrer Amanhã’ (Foto: divulgação / Synapse Distribution)

O você faria se fosse morrer amanhã?

O título do filme já é uma grande reflexão por si só, afinal o que você faria se soubesse que hoje é seu último dia de vida? Seimetz construiu um terror que beira o cômico ao trazer essa discussão, pois é realmente muito lúdico e incontornável descobrir o quão passageira é a vida.

“Eu e Kate Lyn Sheil, que interpreta a Amy, começamos a rir quando paramos para pensar em como iríamos nos sentir se soubéssemos que vamos morrer amanhã. Como seria lidar com a ansiedade de fazer tudo direito, algo que chega a nos paralisar se a gente fracassasse absurdamente, sabe?”, relata a cineasta.

“Sendo bem honesta, eu não saberia o que fazer, eu ficaria com medo de fazer as escolhas erradas e eu provavelmente passaria meu último dia em minha casa fazendo absolutamente nada”, confidencia Amy. “A ideia é você se render ao absurdo e ao fato de que você não tem o menor controle do que vai acontecer. Eu me permiti explorar lugares absurdos pois a piada final é nascemos com cérebros e temos consciência desde o dia em que nascemos e há um fim para isso”.

Pandemia de coronavírus

É difícil assistir à ‘Vou Morrer Amanhã’ sem analisar nossa vida e o qual rumos queremos seguir. Essa observação fica ainda mais densa quando paramos para pensar no atual cenário do mundo com a pandemia de coronavírus. A diretora contou sobre sua experiência em relação a isso.

“Eu procuro sempre enxergar o lado positivo das coisas e eu sou uma felizarda por ter tido a sorte de trabalhar durante a pandemia, fazer um filme com todos os protocolos e é exatamente neste sentido que acredito que as pessoas percebem o quanto precisamos umas das outras”, pontua Amy.

Ela também fala que não podemos esquecer de toda a tragédia que essa doença trouxe: “acho que as pessoas perceberam o quanto precisamos de interação social e nós precisamos um do outro. Eu realmente senti que quando voltei ao trabalho novamente – e tive a sorte de voltar a trabalhar – todos ficaram muito felizes, mesmo tendo que fazer isso com máscara e todos estavam aceitando isso.”

“Eu fico muito feliz por estar aqui. Estou tão feliz por ter conversado como você, sabe? Eu gostaria de mandar tudo isso pro espaço e apenas poder falar sobre o tempo com quem eu quiser, é isso que acho que as pessoas vão tirar disso, a apreciação por outros seres humanos”, finalizou.

Amy Seimetz fez um filme interessante, complexo e que consegue ser duro, mas nem por isso perdeu a esperança nas pessoas. Fica a lição.

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