‘365 Dias: Hoje’: Pouco diálogo, muito sexo e delírio masculino ‘365 Dias: Hoje’: Pouco diálogo, muito sexo e delírio masculino

‘365 Dias: Hoje’: Pouco diálogo, muito sexo e delírio masculino

O segundo filme da trilogia ‘365 Dias’ chegou à Netflix repetindo o sucesso – e ampliando os problemas – do primeiro

2 de maio de 2022 14:31
- Atualizado em 3 de maio de 2022 17:28

Em 2020 (infelizmente) fomos apresentados à primeira parte da trilogia de filmes ‘365 Dias‘, baseada na saga de livros polonesa escrita por Blanka Lipinska. O longa, que pinta uma imagem de romance erótico tal qual ‘Cinquenta Tons de Cinza‘, fez um sucesso estrondoso na Netflix e garantiu mais duas adaptações da história. O segundo filme, ‘365 Dias: Hoje’, chegou ao streaming na última semana e já é um dos mais assistidos na plataforma.

A continuação assume, descaradamente, a posição de um pornô suave e, sem dúvidas, há nicho para disso. Afinal, os números não mentem: o longa está neste momento liderando o ranking da Netflix em mais de 70 países, segundo os dados do Flixpatrol.

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Para refrescar a memória em relação ao filme anterior, a história acompanha o romance de Laura (Anna-Maria Sieklucka) com o mafioso siciliano Massimo (Michele Morrone), que a sequestrou com a ideia de que ela se apaixonasse por ele ao longo de 365 dias. Após abusos psicológicos, Laura acaba simpatizando e se apaixonando por seu agressor, beirando a uma Síndrome de Estocolmo (estado psicológico em que a pessoa passa a ter empatia por seu sequestrador).

Anna-Maria Sieklucka é Laura na trilogia ‘365 Dias’ (Créditos: Divulgação/Netflix)

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Nesse contexto completamente problemático, eles acabam ficando juntos e vivem um intenso romance – regado por muito, mas muito sexo. O conto de fadas é interrompido quando, no final do longa, Laura sofre um acidente e fica aquela dúvida se ela sobreviveu ou não, enquanto Massimo fica aos prantos sem saber o que aconteceu com a amada.

Bom, é meio óbvio que ela está viva, afinal ‘365 Dias: Hoje’ está aí para provar. O incidente é apenas citado no segundo filme para dizer que Laura perdeu o bebê que esperava no ocorrido. Vida que segue, ninguém retoma ou tenta traçar conexões com a trama anterior.

Agora o casal quer saber do presente: estão prontos para se casar e deixar de lado as complicações do passado – e o foco é transar mais do que no primeiro longa, algo que as primeiras cenas já deixam bem claro. ‘365 Dias: Hoje’ pode ser muito bem resumido em uma produção que começa com sexo, seguida de quase duas horas de muita felação e, então, temos um pouco de drama chegando na parte final.

Tá, mas qual o problema? Talvez seja justamente esse. ‘365 Dias: Hoje’ não tem muito a oferecer além de músicas românticas embaladas pelas formas mais diversas de ter uma relação sexual. Mas não seria mais fácil procurar então um filme pornográfico?

Bom, esse conteúdo não tem na Netflix.

A influência da indústria pornográfica em cenas de sexo

Sabemos que tanto esse filme quanto a trilogia ‘Cinquenta Tons’ entregam apenas encenações onde o objetivo é explorar o máximo possível do corpo feminino. Aqui, Laura está constantemente nua, em posições bem naturalizadas pela cultura pornô – e isso no sentido do controle também, já que Massimo exerce um poder sobre ela. Enquanto isso, ele é aquele espécime com um corpo escultural, de acordo com os padrões da sociedade, e não vemos muito além do abdômen sarado.

Por mais comum que isso seja, não deixa de continuar perpetuando certos estereótipos comuns no cinema no geral, que é o da banalidade da objetificação feminina.

É tão “comum” ver diversas partes do corpo das mulheres que isso não chega a causar um impacto como ver um homem nu. Séries como ‘Normal People’, ‘Euphoria’ – e até mesmo ‘Game of Thrones’ – tem tentado quebrar esse padrão, assim como ‘Pleasure’, filme de Ninja Thyberg que chega à MUBI em junho e revela o físico masculino sem censura.

‘Pleasure’, filme elogiadíssimo pela crítica, chega à MUBI em junho (Crédito: Divulgação/MUBI)

Enquanto ‘365 Dias: Hoje’ parece um delírio feito para a mente dos homens – e não com intuito sequer de fazer uma mulher ser instigada a transar -, o filme de Thyberg tenta mostrar um outro lado disso. Por meio da vida de uma moça que deseja se tornar uma estrela pornô, acompanhamos como funciona parte desta indústria.

Mas a narrativa mostra como o empoderamento feminino acaba sendo devorado devido ao poder masculino dentro dessa indústria. A figura da mulher é resumida a apenas um objeto, já que é extremamente difícil ser dona de si dentro de um ambiente gerido por homens e que produz um conteúdo para eles.

Eis que temos um ponto de intersecção entre essas duas produções que nem de longe se aproximam na temática. ‘Pleasure’ tece ótimas críticas sobre como a vida sexual feminina é formada pela cultura pornográfica, já que somos “condicionadas” a agradar os parceiros e grande parte deles – ou praticamente todos – tiveram contato com esse universo.

Já ‘365 Dias’ pavimenta o caminho disso, mostrando que Laura não só se casou com seu sequestrador como se tornou um item de adoração dele. Toda a construção das cenas de sexo parecem elaboradas para fantasias masculinas, apenas a trilha sonora difere um pouco disso, já que não tem sonoplastia erótica e sim músicas românticas. E o trabalho de produção é grandioso: o que pouparam em diálogos investiram na estética erótica.

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