Greve em Hollywood evitada: sindicato e estúdios entram em acordo Greve em Hollywood evitada: sindicato e estúdios entram em acordo

Greve em Hollywood evitada: sindicato e estúdios entram em acordo

Produtores e estúdios aceitaram as reinvindicações do sindicado que representa os profissionais técnicos e artesões de Hollywood

16 de outubro de 2021 21:39

O audiovisual dos Estados Unidos pode respirar aliviada. Na noite deste sábado, 16, um pouco mais de 30 horas antes do prazo final para começar a greve, o sindicato que representa os trabalhadores técnicos e artesões da indústria entrou em acordo com a entidade que representa estúdios, produtores e canais de TV. Não haverá mais greve.

A disputa colocou na mesa de negociações a Aliança Internacional de Funcionários de Palco Teatral, Técnicos de Cinema, Artistas e Artesões Aliados dos Estados Unidos, seus Territórios e Canadá (da sigla IATSE, em inglês) – que tem profissionais de diversas áreas, que trabalham com a produção de filmes e séries em diversos momentos – com a Aliança dos Produtores de Cinema e Televisão (AMPTP) – representante de Paramount, Sony, Warner Bros., Walt Disney, Universal, a Netflix e canais abertos como ABC e CBS, por exemplo.

De acordo com o Deadline, as partes chegaram a um novo acordo, que tem duração de três anos. A assinatura irá acontecer amanhã, domingo (17), poucas horas antes do fim do prazo.

A greve dos roteiristas, que ocorreu entre 2007 e 2008, foi a última paralização do tipo em Hollywood (Crédito: Flickr / Amber Baldet / John Edward)
A greve dos roteiristas, que ocorreu entre 2007 e 2008, foi a última paralização do tipo em Hollywood (Crédito: Flickr / Amber Baldet / John Edward)

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Mais detalhes sobre o contrato devem ser divulgados, mas, de acordo com o veículo, os pontos principais incluem melhoras de salário e nas condições de trabalho nas produções para o streaming. Também será obrigatório um descanso de dez horas entre os turnos de trabalho. Ou seja, quem trabalha até às 23h de um dia só pode voltar ao posto após às 9h do dia seguinte.

Estão prometidas também iniciativas de inclusão e diversidade, além de aumento do fundo de saúde e de pensão.

Caso a greve fosse efetivada, cerca de 60 mil profissionais parariam. São trabalhadores como operadores de câmera e iluminação, eletricistas, engenheiros de áudio, editores, coordenadores de roteiro, diretores de arte e afins. Sem eles, as filmagens e até mesmo os trabalhos de pré e pós-produção ficam inviabilizados.

Isso poderia ter um grande reflexo negativo em uma indústria que já sofreu (e ainda sofre) com as medidas de combate à covid-19. Agora, todos podem respirar aliviados – principalmente os trabalhadores, com a promessa de melhores condições para trabalharem.

O que aconteceu?

O IATSE é um um dos sindicatos mais antigos na América do Norte, tendo sido criado em 1893 para representar os contrarregras do teatro. Desde então, expandiu a sua atuação, abraçando profissionais das indústria de cinema e televisão, de shows musicais, feiras e muito mais.

Além de profissionais mais técnicos, como eletricistas, engenheiros de áudio e operadores de iluminação e câmera, a organização representa gerentes de palco, editores e até coordenadores de roteiro e diretores de arte. São trabalhadores nos mais diversos pontos da produção de um produto audiovisual.

O coordenador de roteiro, por exemplo, é o responsável por cuidar de cada versão do roteiro, revisando erros, fazendo anotações, cuidando da continuidade e até se está tudo ok com o departamento jurídico. Além disso, faz a ponte entre a sala dos roteiristas e quem está no set, efetivamente gravando.

Esses profissionais, principalmente os de filmes e séries, nunca tiveram vida fácil. Em 1997, o operador de câmera Brent Lon Hershman, que trabalhou em filmes como ‘Proposta Indecente’ e ‘Jornada nas Estrelas VI: A Terra Desconhecida’, voltava para casa após 19 horas de trabalho no set de ‘Pleasantville: A Vida em Preto e Branco’ quando sofreu um acidente de carro e morreu. Ele tinha apenas 35 anos, em uma história contada no documentário ‘Who Needs Sleep?‘.

 Brent Lon Hershman, ao lado da esposa e das filhas: ele morreu em um acidente de carro após trabalhar 19 horas por dia (Crédito: reprodução / IMDb)
Brent Lon Hershman, ao lado da esposa e das filhas: ele morreu em um acidente de carro após trabalhar 19 horas por dia (Crédito: reprodução / IMDb)

Nos últimos anos, os membros da IATSE se viram ainda mais pressionados com a chegada do streaming. O volume de produções cresceu, porém o tempo de produção diminuiu, junto com o advento das temporadas menores.

Isso criou um ambiente onde o ritmo de filmagens é frenético, com muitas horas de trabalho, enquanto os membros do IATSE se vêm obrigados a trocar de emprego em espaços de tempo cada vez menores. Se antes ficavam nove, fez meses gravando uma série para TV aberta, hoje ficam três em uma produção da Netflix, por exemplo.

Por isso, o sindicato começou a pleitear mudanças nessa relação com os produtores. Entre as demandas, estão um maior salário mínimo, um período mínimo de pausa entre um dia de trabalho e o outro, o fim da classificação de streaming como “nova mídia” (o que permite salários menores), e que os estúdios parem de pular pausas ou refeições.

Tentativa de acordo

Com essas demandas, a IATSE foi em busca de um acordo com a Aliança dos Produtores de Cinema e Televisão (AMPTP, da sigla em inglês), que representa estúdios como Paramount, Sony, Warner Bros., Walt Disney, Universal, a Netflix e canais abertos como ABC e CBS. Não conseguiram.

A partir daí, a aliança dos trabalhadores botou em pauta a votação para que os membros autorizassem uma greve, necessitando de mais de 75% de “sim” para aprovação – o que ocorreu. Dessa forma, o sindicato foi mais uma vez em busca de acordo com o AMPTP, usando a aprovação da greve como barganha.

A famosa caixa d'água da Warner Bros.: o estúdio será um dos afetados pela greve (Foto: divulgação Warner Bros. Studios)
A famosa caixa d’água da Warner Bros.: o estúdio será um dos afetados pela greve (Foto: divulgação Warner Bros. Studios)

O ritmo, no entanto, frustrou os integrantes da IATSE. “Os empregadores repetidamente se recusam a fazer o necessário para se chegar a um acordo justo. Ou eles não reconhecem o que mudou na nossa indústria e entre os nossos membros, ou eles não se importam. Ou ambos”, disse Cathy Repola, uma das diretores executivas da organização, ao Deadline.

O últimato para a greve

No último dia 13, a Aliança dos Técnicos e Artesões informou que, até aquele momento, não havia qualquer acerto – e deu o ultimato final.

“Se um acordo não for feito, os membros da IATSE começarão uma greve nacional à 0h01 de 18 de outubro, horário do Pacífico”, disse a organização em um comunicado. “[Matthew] Loeb [presidente da IATSE] disse que continuará barganhando com os produtores nesta semana e espera chegar a um acordo nos temas principais, como períodos de descanso razoáveis, pausas para alimentação, e um salário que dê condições de vida aos que estão na base da escala salarial”.

“Porém, o ritmo da barganha não reflete nenhum senso de urgência”, afirmou Loeb no comunicado. “Sem uma data limite, poderia durar para sempre. Nossos membros merecem que suas necessidades básicas sejam discutidas agora.”

Após o ultimato, a Aliança dos Produtores se pronunciou, informando que “há cinco dias completos para se chegar a um acordo, e os estúdios vão continuar negociando de boa-fé em um esforço de se chegar a um acordo de um novo contrato que mantenha a indústria trabalhando.” Como vemos, o prazo foi suficiente.

Desdobramentos para a indústria

A paralização poderia ter tido um grande efeito no que está sendo produzido nos Estados Unidos. Sets de cinema e parte dos de televisão poderiam ter parado parar. No entanto, a greve não afetaria produções no exterior, transmissões esportivas e nem gravações locais para o que é chamado de “TV paga” (incluindo produções de Cinemax, HBO, Showtime e Starz) por haver um acordo separado com essas organizações. Gravações de videoclipes e as peças teatrais também não entrariam.

Sem a equipe técnica, não há como fazer filmes e séries (Crédito: Flickr / Alex Lang)
Sem a equipe técnica, não há como fazer filmes e séries (Crédito: Flickr / Alex Lang)

Agora, são três anos com o novo acordo. Resta saber quais serão os impactos no custo e tempo de produção, por exemplo, e até mesmo se todas as determinações serão realmente respeitadas.

De qualquer forma, a medida foi uma grande vitória para a IATSE – que não só conseguiu um contrato que estabelece melhores condições de trabalho para uma parte importante dos envolvidos na produções de filmes e séries, como mostrou força para conseguir ainda mais conquistas nas próximas negociações.

Outras greves em Hollywood

A greve mais conhecida é dos roteiristas, que ocorreu entre 5 de novembro de 2007 e 12 de fevereiro de 2008. Na época, o sindicato da categoria demandava uma parte maior das receitas dos grandes estúdios, principalmente – veja novamente o nome aparecer – nas chamadas “novas mídias”, incluindo streaming.As repercussões incluíram séries que tiveram temporadas menores ou reutilizaram roteiros antigos, talk shows que foram ao ar sem monólogos de abertura, e filmes que foram ou atrasados ou foram rodados sem ter um roteiro efetivamente pronto.

Depois de um pouco mais de três meses, os dois lados entraram em acordo sobre as receitas dos programas e filmes, encerrando a paralização.Outras greves de roteiristas ocorreram em 1988 (por 22 semanas), em 1985 (por duas semanas) e em 1981 (outros três meses). Em 1987, os diretores pararam por apenas três horas.

Comício do Sindicato dos Roteiristas durante a greve de 2007 (Crédito: Flickr / Amber Baldet / John Edward)
Comício do Sindicato dos Roteiristas durante a greve de 2007 (Crédito: Flickr / Amber Baldet / John Edward)

Já a última possibilidade de greve, que não se concretizou, foi em 2017 – quando mais uma vez os roteiristas exigiram maiores receitas das produções para o streaming. Na época, um novo acordo foi feito.

Mais uma vez, a mudança na forma como consumimos conteúdo impacta na indústria do entretenimento – e, por fim, na relação de empregados e empregadores. Como vemos, até aquela inocente comédia que você assiste na Netflix tem desdobramentos no mundo…

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