Filmes

Luto, família e memória: os destaques dentre os curtas do Festival de Toronto 2020

Assistir aos curtas de um festival é sempre uma caixinha de surpresas. Afinal, a grande quantidade de histórias selecionadas, a imprevisibilidade de temas e o experimentalismo de algumas das tramas acabam trazendo momentos interessantes, para dizer o mínimo. Ou, até mesmo, estranhos.

No Festival de Toronto de 2020, que terminou no último fim de semana, muita coisa pouco interessante ganhou as telas nos cinco programas apresentados com cerca de 35 curtas. Algumas das histórias eram experimentais demais, beirando o ininteligível. Outras, enquanto isso, abraçaram o simplório e não conseguiram sair do óbvio.

‘Still Processing’ foi um dos grandes destaques dos programas de curtas do TIFF (Crédito: Divulgação/TIFF)
Mas, no meio de tanta coisa, três temas se destacaram, dando uma indicação do que pode vir na temporada de premiações nessas categorias: luto, família e memória. Algumas histórias, que abordaram esses temas de diferentes maneiras, emocionaram público e crítica, ganhando destaque.

Luto

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Pessoas lidando com perdas é um tema comum em curtas. Nos últimos anos, é comum ver o Oscar selecionando histórias sobre pessoas lidando com a morte de parentes próximos ou até mesmo com a própria finitude. No TIFF, o luto rendeu alguns dos melhores curtas-metragens do festival. ‘Still Processing‘, por exemplo, emocionou com um mergulho na vida da própria cineasta, Sophy Romvari. Afinal, ao longo dos 17 minutos de projeção, ela precisa lidar com fotos de sua infância e se confrontar com a figura dos irmãos, mortos precocemente, eternizada no papel.
‘4 North A’ emociona com personagem lidando com a partida do pai em um hospital (Crédito: Divulgação/TIFF)
Já o belíssimo curta-metragem de animação ‘4 North A‘ traz algo um pouco batido, dada a recorrência dessa história em premiações nos últimos anos: uma filha lidando com a eminente morte do pai. Os traços coloridos, de lápis de cor, ajudam a dar o tom memorialista do curta-metragem. É bonito.

Família

Já pegando de gancho essa relação entre pai e filha de ‘4 North A’, vamos falar sobre o outro tema que dominou o programa de curtas: a família. Aqui, foi possível ver retratos de famílias das mais diversas maneiras e, o que é mais interessante, nos mais diferentes formatos de curtas no TIFF. ‘The Game‘, por exemplo, foca em mostrar o trabalho de um árbitro de futebol com diálogos, imagens e sons que nunca vemos. No entanto, como pano de fundo, o diretor Das Spiel acerta em cheio ao colocar uma câmera no pai e no filho do juiz de campo tendo que lidar com xingamentos. Já ‘David‘, curta-metragem com Will Ferrell, William Jackson Harper e Fred Hechinger, mostra a relação de um psicólogo com seu filho em um momento estranho. Afinal, o rapaz pede a atenção do pai justamente quando ele está em um atendimento complicado. O final é revigorante.
Ferrell é o destaca do curta, com uma atuação mais séria e contida (Crédito: Divulgação/TIFF)
Por fim, o elegante ‘In Sudden Darkness‘ emociona com sua aparente simplicidade ao contar a história de uma família negra do Brooklyn durante um apagão. A união de laços, a urgência de se aproximarem e o estreitamento de relações entre os familiares é de uma leveza graciosa.

Memória

Por fim, chega o último tema de destaque. A memória, a relação com o passado e coisas do tipo. Ainda que alguns curtas anteriores também façam isso, como ‘Still Processing’ e ‘4 North A’, alguns tem esse assunto como o foco principal de sua história e no desenvolvimento de seus personagem. É o caso do maravilhoso curta-metragem distópico ‘The Archivists‘. Aqui, o diretor canadense Igor Drljaca conta a história de um grupo de amigos, em um futuro que a cultura já não existe. Do nada, porém, resolvem parar em uma casa. Lá encontram um disco e começam a reconstruir letra e melodia. Logo, assim, surge ‘Smalltown Boy’, de Bronski Beat, nos instrumentos arcaicos daquele grupo. Difícil, assim, não fazer relações com a atualidade.
cu‘Navozande, the Musician’ é o curta-metragem que mais deve arrancar suspiros e lágrimas do público (Crédito: Divulgação/TIFF)
Por fim, há o curta-metragem mais delicado do Festival de Toronto: ‘Navozande, the Musician’. Dirigido por Reza Riahi, o curta-metragem se passa no século XIV e conta a história de uma mulher já idosa que reconhece um antigo amor tocando instrumentos em uma festa. De chorar. A técnica usada para animação também salta aos olhos: Riahi desenvolveu todo o curta-metragem com desenhos em papel. Delicadeza na trama e também nos traços. É difícil fazer previsões para o Oscar 2021 nessas categorias, ao contrário de longas. Mas fica o registro: difícil, muito difícil, ‘Navozande, the Musician’ não ser indicado em Melhor Curta de Animação.

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Matheus Mans

Jornalista especializado em cultura e tecnologia, com seis anos de experiência. Já passou pelo Estadão, UOL, Yahoo e grandes sites, sempre falando de cinema, inovação e tecnologia. Hoje, é editor do Filmelier.

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