“A crise revela a face mais sombria do ser humano”, diz diretor de ‘O Destino de Haffmann’ “A crise revela a face mais sombria do ser humano”, diz diretor de ‘O Destino de Haffmann’

“A crise revela a face mais sombria do ser humano”, diz diretor de ‘O Destino de Haffmann’

Em entrevista exclusiva, o cineasta Fred Cavayé fala sobre a relevância de abordar a “guerra de portas fechadas”

Matheus Mans   |  
18 de agosto de 2022 20:33

O Destino de Haffmann‘, filme que está em cartaz nos cinemas brasileiros desde a última quinta-feira (11), não é apenas uma história sobre a Segunda Guerra Mundial. Aliás, dizer que é um longa-metragem sobre o conflito é simplificar uma equação demasiadamente humana e complexa. Afinal, esta produção dirigida por Fred Cavayé (‘À Queima Roupa’) e adaptada da peça de teatro de Jean-Philippe Daguerre, fala sobre pessoas, traição, conflitos, ganância.

No mundo “lá de fora”, afinal, a Segunda Guerra está acontecendo, com a França sendo invadida pelos alemães. Aquela história de sempre. Na trama de ‘O Destino de Haffmann’, enquanto isso, há um universo particular: o judeu e joalheiro Joseph Haffmann (Daniel Auteuil) decide largar tudo pra trás na França e ir embora do país com a esposa e os filhos. Vende a joalheria da família para François Mercier (Gilles Lellouche), que passa a tomar conta dos negócios.

Gilles Lellouche é um dos protagonistas de ‘O Destino de Haffmann’ (Crédito: Divulgação/Synapse)

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Só que nem tudo sai como o planejado. Haffmann não consegue atravessar a fronteira e fica pra trás. A única saída é ficar morando no porão de sua antiga joalheria, agora sob o comando desse outro homem que, antes, era seu amigo e ajudante. Em um cenário em que o nazismo toma conta e não parece haver muitas saídas em um futuro próximo, Haffmann vai ficando acuado. O porão vai se tornando pequeno demais para seus medos, suas angústias e frustrações.

“Há muito tempo eu queria contar a história de pessoas que se comportaram mal durante esse período sombrio que foi a ocupação alemã entre 1940 e 1944. A peça de Jean-Philippe Daguerre, da qual o filme é adaptado, não fala exatamente sobre isso, mas foi um excelente ponto de partida”, conta Fred Cavayé em entrevista exclusiva ao Filmelier.

“De fato, o contrato entre Haffmann e esse jovem casal me permite desviar a história da peça para o tema da colaboração passiva e, sobretudo, contar como ‘pessoas normais’ se aproveitaram da situação e cometeram atos imperdoáveis”, revela.

‘O Destino de Haffmann’ e as novas perspectivas

Lembra bastante, ainda que de perspectivas completamente distintas, o filme húngaro ‘1945’. Nesta joia do cinema europeu, judeu retornam para uma cidadezinha da Hungria após a guerra e veem todos seus bens tomados. Dessa forma, ‘O Destino de Haffmann’ escapa de algo que já está chegando em uma saturação bastante evidente: o cinema sobre a Segunda Guerra Mundial, sempre com histórias que se repetem e andam em círculos, fixos no lugar-comum.

“Há muitos filmes no cinema francês que falam desse período, mas muitas vezes se interessam, com razão, por heróis e não por ‘bastardos'”, diz o diretor. “Além disso, achei interessante fazer um filme de guerra a portas fechadas. Contar a grande história pelo prisma da pequena história deste casal e deste joalheiro. A guerra está acontecendo do outro lado dos muros desta joalheria, mas dentro também há algo horrível e terrivelmente perigoso. Contando a relação desses três personagens como um thriller, preocupado com o futuro de Haffmann e temendo por sua vida”.

Nesse prisma, algo acontece no filme: apesar de se passar nos anos 1940, ele se torna atual. Afinal, não vivemos mais na Segunda Guerra. Mas convivemos com pessoas horríveis.

“É terrivelmente atual”, diz o cineasta. “Houve, há e ainda haverá ‘bastardos’. Os períodos de crise revelam as faces mais sombrias do ser humano. Então você tem que ser duas vezes mais vigilante. Porque como o personagem de François, sob o pretexto de proteger sua família, ele se tornará igual aos carrasco. Ninguém está a salvo de se encontrar do lado errado da história quando nos deixamos guiar por medos”.

E isso, é claro, causa reverberações até mesmo no Brasil de hoje, mesmo com a história sendo sobre um homem, judeu, francês e vivendo no conflito da década de 1940. “Meu trabalho como cineasta e provocar emoções no espectador que vê meus filmes. Eu sempre tento lidar com assuntos ‘universais’ porque acho ótimo que uma mesma história provoque os mesmos sentimentos no Rio, Paris e Pequim, ao mesmo tempo e no mesmo lugar: um cinema”.

‘O Destino de Haffmann’ está nos cinemas. Se você quiser saber mais sobre o filme ou encontrar o link para comprar ingressos, clique aqui.

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