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‘Quem Tem Medo?’: Filme reflete sobre efeitos de Jair Bolsonaro nas artes
Documentário mostra casos de censura ou de boicote em apresentações artísticas que contrariavam o movimento conservador do bolsonarismo
O cinema documental se provou como uma boa ferramentas para registrar e compreender momentos históricos. No Brasil, em tempos mais recentes, já foram feitos filmes sobre o impeachment de Dilma Rousseff (‘O Processo‘, ‘Democracia em Vertigem‘), sobre a Lava Jato (‘Amigo Secreto’) e, agora, o que reflete sobre os efeitos do bolsonarismo no mundo das artes. É ‘Quem Tem Medo?’, documentário que chega aos cinemas na última quinta-feira, 4.
Dirigido pelo trio Ricardo Alves Jr., Dellani Lima e Henrique Zanoni, o filme tem uma premissa bem simples: mostrar, contando histórias e trazendo relatos, artistas que tiveram seus trabalhos atrapalhados pelo bolsonarismo — desde antes desse movimento, inclusive, ter esse nome. É o artista que foi atacado nas redes sociais por permitir interação de criança quando estava nu, o Queermuseu, o artista que leva pedradas no palco de uma plateia que se torna raivosa. O coreógrafo Wagner Schwartz foi alvo de protestos com seu espetáculo La Bête (Crédito: Divulgação/Dellani Lima)
“A gênese foi de 2016 para 2017, quando comecei a acompanhar o grupo A Motosserra Perfumada. Eles tinham acabado de criar um espetáculo, iam fazer a leitura e tive a ideia de fazer o registro disso. No processo, o espetáculo foi censurado. Naquele momento, alguns outros espetáculos e eventos também tinham passado por isso e veio a ideia de fazer um registro maior, de tudo que estava acontecendo com a arte no Brasil”, contextualiza o diretor Dellani Lima. Foi aí que a ideia cresceu. Chamou Ricardo e Henrique para comandar o filme ao seu lado, buscando sempre uma conexão de ideias. Aos poucos, ‘Quem Tem Medo?’ ganhou forma. “O Dellani tem um material muito grande de artistas que passaram por momentos de censura ou de perseguição”, explica Ricardo Alves Jr.. “E esse conteúdo tinha algo forte: de que ponto de vista vamos narrar essa história? Era a vontade de contar isso a partir da visão dos próprios artistas, pensando em como colocar também na voz de políticos que criaram esse clima de perseguição”.
‘Quem Tem Medo?’ e sua importância
Apesar do início do trabalho ter começado em 2016, com os principais acontecimentos relatos no filme terem se passado junto com a gênese do bolsonarismo, ‘Quem Tem Medo?’ chega em um momento em que o governo de Jair Bolsonaro pode estar com os dias contados — pelo menos é o que indicam as pesquisas eleitorais. Por que lançar o filme só agora? “Explicitamente, em nosso planejamento, a ideia era lançar no segundo semestre”, explica Henrique.
Segundo ele, os envolvidos no lançamento do documentário até mesmo abriram mão de tentar uma carreira mais tradicional com o filme, lançando em festivais e coisas do tipo, já que achavam importante que o longa suscitasse debates agora. “O filme traz uma questão que a gente vê em várias peças, como temática mesmo, que o que esses artistas foram sofrendo nesse período foi um prenúncio com o que ia acontecer com todo mundo”, diz o cineasta. “E a gente traz no título a questão do mundo. Sentíamos isso em 2016 e 2017 entre artistas, mas agora espraiou para toda a sociedade”. Henrique, aliás, tem um exemplo claro de como as coisas avançaram. “Se antes eles entravam em uma peça e tacavam uma pedra, hoje eles entram em uma festa e matam. Esses artistas tiveram a sensibilidade em 2017 de entender que um führer, junto com um movimento religioso, ia tentar dar um golpe militar entre 2022 e 2023”, diz o cineasta. Agora, com o documentário na tela, é possível não só ver a gênese do bolsonarismo, como livrar os artistas de um peso. “O Zé Neto me falou que vê que o filme pode falar por ele e pode curar suas feridas, sem precisar reviver o que aconteceu a todo momento”, diz Ricardo, citando um artista que levou uma pedrada durante um espetáculo.
