Saúde mental é o tema central do Festival de Toronto 2021 Saúde mental é o tema central do Festival de Toronto 2021

Saúde mental é o tema central do Festival de Toronto 2021

Filmes como ‘Violet’, ‘All My Puny Sorrows’ e ‘Um Ninho para Dois’ falam sobre psicologia e saúde mental das mais diversas maneiras

Matheus Mans   |  
17 de setembro de 2021 10:25

Durante a pandemia da covid-19, o isolamento social, o distanciamento e as feridas que se abriram durante o período despertaram uma profunda discussão na sociedade sobre saúde mental. Ainda que a importância desse tema seja atemporal, nunca se falou tanto sobre o cuidado psicológico. Isso, agora, está refletido no Festival Internacional de Cinema de Toronto.

Ainda que não tenha um tema oficial ou coisa do tipo, o TIFF claramente abraçou filmes que falam sobre saúde mental. Das 30 produções selecionadas pelo festival e assistidos pelo Filmelier, 12 falavam direta ou indiretamente sobre questões relacionadas ao cuidado psicológico. Alguns com uma densidade mais chamativa, outros buscando alguma leveza para abordar esse tema.

Violet’, protagonizado por Olivia Munn, é um dos mais chamativos sobre essa temática. Um dos primeiros filmes exibidos para a imprensa, o longa-metragem conta a história de uma produtora de filmes de Hollywood que está passando por uma intensa crise de ansiedade. Tudo para ela é gatilho: a conversa com o chefe, decisões cotidianas. A vida.

‘Violet’ mostra a jornada dessa mulher tentando vencer a crise de ansiedade (Crédito: Divulgação/Festival de Toronto)

🗣 Confira os filmes que estão dando o que falar no Festival de Toronto – e que serão lançados nos próximos meses.

A cineasta Justine Bateman, que faz sua estreia em longas, disse pouco antes da exibição do filme que queria fazer uma experiência imersiva, visual. E conseguiu. Ao longo do filme, escutamos A Voz. É a consciência da protagonista, enfraquecendo suas decisões. A partir daí, brincadeiras visuais com cores estouradas na tela, por exemplo, complementam a tela.

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No todo, temos uma experiência realmente imersiva, como queria Justine, e que causa certo desconforto. Apesar de obviamente não ser a mesma coisa que ter ansiedade, ou estar em uma crise, entendemos melhor como funciona a cabeça de quem está passando por um momento como esse. É uma maneira de compreendermos melhor o outro em situações similares.

Mais saúde mental

Outro filme que busca uma experiência altamente imersiva, também no Festival de Toronto, é o equatoriano ‘Lo Invisible’. O invisível, na tradução literal. E o que seria isso que não vemos? É a depressão de Luísa, mulher de 45 anos que teve uma crise depressiva pós-parto de seu filho. Foi internada e, agora, acompanhamos no filme o seu retorno doloroso para casa.

Ao longo de 94 minutos, numa experiência tão importante quanto melancólica, acompanhamos essa mulher tentando se encaixar no padrão que as pessoas ao seu redor desejam — mãe, dona de casa, cuidando de seus filhos. No entanto, a depressão, essa ameaça invisível para muitos, não cessa. Dessa forma, o diretor Javier Andrade choca com uma trama inclemente.

Também falando sobre depressão, mas sem tocar diretamente no tema, está o drama ‘All My Puny Sorrows’, que é inspirado num best-seller homônimo. Conta a história de duas irmãs: uma é escritora, sem grandes sucessos na vida amorosa; a outra é uma pianista renomada. Entramos no filme justamente quando a segunda quer cometer suicídio. Direto assim.

All My Puny Sorrows fala sobre saúde mental
‘All My Puny Sorrows’ acompanha duas irmãs em um momento de instabilidade psicológica de uma delas (Crédito: Divulgação/Festival de Toronto)

Ao longo do filme, então, acompanhamos essas duas personagens interpretadas por Sarah Gadon e Alison Pill tendo discussões bem francas sobre saúde mental, vida, luto e morte. Poderia ser um filme mais coeso e acertado em termos de atuação, mas traz algumas boas questões à tona. Afinal, suicídio é algo que precisa ser conversado para ser, enfim, evitado.

Saúde mental sem tabu

Por fim, há aqueles filmes de sempre que falam sobre psicologia e saúde mental sem necessariamente trazer casos fortes, histórias pesadas. ‘Um Ninho para Dois’, que já chega no catálogo da Netflix em 24 de setembro, é um bom exemplo. Protagonizado por Melissa McCarthy, o filme fala sobre uma mulher passando por um momento delicado de perda e luto.

Ainda que cometa alguns consideráveis tropeços quando tenta falar sobre o espaço da terapia e a importância de um psicológico, é aquilo: com a atuação de McCarthy, incluindo algumas de suas clássicas piadas, vemos o tema com mais leveza. A psicologia pode até surgir de maneira um pouco torta na tela, mas acabamos absorvendo a principal mensagem do longa.

Outro bom destaque que trata da psicologia de maneira indireta é ‘Encounter’, um filme produzido pela Amazon e ainda sem data de estreia no Brasil. Protagonizado por Riz Ahmed, o filme acompanha a jornada de um pai com seus dois filhos em um mundo devastado. Afinal, aliens invadiram o planeta Terra e estão parasitando as pessoas sem perceberem.

‘Encounter’, com Riz Ahmed, é uma das boas surpresas do festival, se valendo do thriller para falar de temas densos (Crédito: Divulgação/Amazon)

A discussão sobre saúde mental surge do nada, quando menos esperamos, e traz alguns momentos realmente inspirados. Não posso falar sobre o que é essa discussão, tampouco como ela é importante dentro do próprio contexto dos Estados Unidos nos últimos anos, pois seria spoiler. Mas fique avisado: quando for assistir a esse filme, vai ter boa reflexão.

Será que é a hora de tanto?

Depois desses filmes e de tantos outros que não foram citados aqui no texto, como o experimental ‘True Things’ ou ‘Nobody Has to Know’, apenas surge uma dúvida: será que era o momento para tanto conteúdo sobre saúde mental? Não que as pessoas devam parar de falar sobre isso ou, até mesmo, falar menos. Não, pelo contrário: é importante saber e discutir.

No entanto, como dito lá no começo desse texto, passamos por um momento de fragilidade emocional. As pessoas nunca estiveram tão distantes uma das outras. Nunca as pessoas perderam tantos entes queridos ou se viram desamparadas. Vivemos um momento em que as pessoas precisam ser escutadas, por psicólogos, amigos e familiares.

Alguns desses filmes, acredito, podem ser gatilhos pesados para pessoas que não estão realmente preparadas para lidar com assuntos tão densos.

‘Um Ninho para Dois’ e ‘Encounters’ foram bem menos elogiados do que ‘Lo Invisible’ ou ‘Violet’, por exemplo. Mas, convenhamos, eles acabam encontrando ainda mais pessoas no final, amaciando a mensagem e, ainda assim, a entregando. Vamos falar mais de psicologia, mais de saúde mental. Mas devemos lembrar que o audiovisual também precisa aquecer, abraçar. Não só alertar.

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