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“Foi uma experiência horrível”, diz diretor de ’20 Dias em Mariupol’

Além da guerra de tiros, bombas e sangue que está acontecendo neste momento na Ucrânia e na Rússia, há um outro conflito mais silencioso e que é travado sem pausas ou respiros: a guerra de narrativas. Quem contar a melhor história, ganha – e fica na memória de muitas pessoas. É por isso que 20 Dias em Mariupol, estreia nos cinemas desta quinta-feira, 7, é tão importante: é uma das principais armas contra a forte narrativa russa.

Afinal, além de muitos outros debates, uma discussão central se instaurou na guerra Ucrânia-Rússia: se os russos estavam realmente atacando alvos civis. A Ucrânia e seu presidente, Volodymyr Zelensky, dizem que sim. A Rússia de Vladimir Putin diz que não.

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No meio disso, há Mstyslav Chernov, jornalista ucraniano da Associated Press que já cobriu seis guerras e não saiu da região de Mariupol quando começou a ser invadida pelas tropas russas. “Vim para Mariupol para filmar para canais de notícias, bem naquele momento em que a Rússia estava dizendo que não estava bombardeando a população civil, que estavam mirando apenas em militares. Vimos que não era assim”, conta o cineasta ao Filmelier.
Chernov ficou 20 dias em Mariupol filmando o cerco russo contra a cidade (Crédito: Synapse Distribution)
Chernov conta que sua prioridade, durante o cerco, era apenas filmar cada momento e enviar imediatamente para “garantir que as pessoas vissem ao redor do mundo o que estava acontecendo”. “Só que fui percebendo que essa história é maior e ainda mais importante do que eu pensava no início”, diz. “Não é apenas a história do meu povo. É uma história que precisamos contar em uma escala maior e garantir que não seja esquecida”. Segundo ele, o que o movia a filmar no meio da guerra era o desejo de preservar a história – uma história simbólica, uma história importante para a Ucrânia e uma história importante para o mundo. “Isso me levou a pensar que aquilo que estava filmando precisava ser um filme, ainda que, naquele momento, eu me preocupava mesmo era em sobreviver”, diz.

20 Dias em Mariupol e a dor na edição

Depois de registrar a guerra in loco e perceber o que tinha em mãos, chega outro momento da narrativa a ser construída: entender, na edição, qual será a linha de pensamentos aqui. E este é outro problema. Revisitar tudo aqui, para o cineasta, foi traumatizando. “Foi uma experiência horrível, muito difícil e triste”, explica. “Eu estava à beira do colapso mental porque continuava vendo todas as cenas durante o dia e à noite. Foi tão difícil. Mas, ao mesmo tempo, tão urgente porque era uma história relevante e não representava apenas o meu povo, mas todas as cidades que estavam sendo bombardeadas naquele momento”. Neste momento, conta o diretor, surgiu o primeiro lampejo de narrativa, bem ali na mesa de edição: tornar aquele momento único e específico mais relacionável com o resto do mundo. “Como contar essa história? Como garantir que estávamos expressando a gravidade da tragédia e a escala da tragédia de uma maneira que também respeitasse as vítimas e também não afastasse o público por ser forte demais?”, questiona. “O filme é bastante difícil emocionalmente, mas é uma experiência humana universal. É muito relacionável e há muita esperança nessas tragédias. Esperança de comunidade e união entre as pessoas”.
A destruição está para todos os lados em 20 Dias em Mariupol (Crédito: Synapse)
Por fim, há a questão de mostrar com imagens que não são atores ali – pelo menos uma mulher, que saiu ferida de dentro de um hospital, não tem condição alguma de ser atriz, principalmente pelo estado em que estava. “Me doeu perceber que era uma guerra que não apenas estava matando meu povo, como também estava matando a verdade”, diz Chernov.

Prêmios e palmas para 20 Dias em Mariupol

Hoje, 20 Dias em Mariupol já é um dos mais premiados da temporada. Ganhou o BAFTA de Melhor Documentário e é o favorito para levar o Oscar na categoria – além disso, Mstyslav Chernov ganhou prêmios importantíssimos pela cobertura do cerco, como o  Prêmio Pulitzer de Serviço Público e o Prêmio Deutsche Welle de Liberdade de Expressão. Para ele, ganhar é mais do que reconhecimento pessoal. “É importante porque somos capazes de continuar lembrando das milhões de pessoas mortas”, diz. “É ainda mais urgente do que antes porque não se trata apenas de receber prêmios e reconhecimento. Tudo isso está ajudando a encontrar mais público. As pessoas vão para a zona de guerra no conforto de suas casas, e é aí que esse reconhecimento ajuda. Para dizer, na verdade, como seres humanos, isso é o que precisamos quando nosso mundo está em chamas”.

20 Dias em Mariupol estreia em 7 de março. Clique aqui para já comprar seu ingresso.

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Matheus Mans

Jornalista especializado em cultura e tecnologia, com seis anos de experiência. Já passou pelo Estadão, UOL, Yahoo e grandes sites, sempre falando de cinema, inovação e tecnologia. Hoje, é editor do Filmelier.

Escrito por
Matheus Mans

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