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‘Bela Vingança’ mostra uma nova representação feminina no cinema

Um dos filmes mais surpreendentes da temporada de premiações de 2021 é ‘Bela Vingança’ – ou ‘Promising Young Woman’, no título original. Com cinco indicações ao Oscar, incluindo de melhor direção e filme, esse é o longa-metragem de estreia de Emerald Fennell, que também escreveu o roteiro.

Fennell mostrou que não só é boa atriz (ela pode ser vista como a Camille na terceira e quarta temporada da série ‘The Crown’), mas também é uma excelente diretora. Logo no primeiro filme, acertou precisamente.

Muito porque ‘Bela Vingança’ não é uma produção usual. Ela foge dos padrões narrativos e temáticos vistos em Hollywood. E ter sido indicada a prêmios como Globo de Ouro, BAFTA e Oscar representa uma importante mudança na própria indústria.

Carey Mulligan é a protagonista de ‘Bela Vingança’ (Foto: Divulgação/Focus Features)
Partindo de um ponto de vista mais pessoal, é difícil ser uma mulher e assistir a um filme desses sem se sentir emocionalmente tocada e, até certo ponto, aliviada. Eu, Raíssa, como jornalista e amante de cinema, fico muito empolgada ao ver que as mulheres estão ressonando na indústria cinematográfica e com histórias completamente factuais, além de necessárias.

A mensagem de Emerald Fennell ecoa além de uma bela vingança

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‘Bela Vingança’ traz uma abordagem que de fato é importante para uma geração – e homens estão inclusos nisso. Traduzir o título original do filme, uma jovem promissora, funciona com a faixa etária que mais vai se identificar com essa narrativa. Afinal, é raríssimo (se é que existe) encontrar uma mulher que não tenha passado por uma situação de assédio e/ou abuso ao longo da vida. Como o nome já entrega, essa é uma história que trata de vingança – infelizmente seria mais interessante se não tivessem, no título nacional, dado essa informação de prontidão – que é ligada a traumas femininos, sendo esse o ponto mais crucial de toda a sacada da diretora Emerald Fennell. No filme, a brilhante Carey Mulligan – que está concorrendo ao Oscar por sua atuação – interpreta Cassie, uma mulher que desistiu de todos os seus objetivos de vida para ensinar os homens uma lição. Essa nova meta nasceu após um evento perturbador envolvendo sua melhor amiga. Fennell vai construindo um mistério em torno do que Cassie realmente faz com seus objetos masculinos. Essa é uma boa jogada, especialmente por ser uma mulher assumindo o controle de experiências traumáticas que toda uma geração feminina enfrenta. Queremos um mundo igualitário? Claro que sim, mas infelizmente parece que diálogo muitas vezes não é solução, então a protagonista de ‘Bela Vingança’ resolve fazer justiça com suas próprias mãos – não, o filme não entra no mérito da misandria. Imagine um mundo onde cada mulher que sofreu um abuso decide se vingar dos assediadores, isso é no mínimo assustador e esse susto é um dos méritos do roteiro.
‘Bela Vingança’ foi indicado a cinco prêmios no Oscar, incluindo melhor filme, roteiro e direção (Foto: Reprodução/Focus Features)
A diretora deixa claro que de boas intenções o mundo está cheio, até porque existem diversos exemplos masculinos positivos. Entretanto, é na cultura de “passar o pano” em atitudes machistas de outros homens que mora o perigo e eis o grande alerta da narrativa. Não é preciso assediar alguém para se tornar um assediador, ser complacente com esse tipo de atitude não te isenta da culpa.

‘Cléo das 5 às 7’ teve que andar para que ‘Bela Vingança’ pudesse correr

A estética da produção é bem estereotipada, o que parece ser uma sátira ao conceito que a sociedade construiu da persona feminina. Cassie tem uma apresentação bem Lolita, delicada e angelical, a imagem da feminilidade. Ela é loira, tem os cabelos longos e é desejada, e sabe como usar isso. Podemos notar uma referência ao que a diretora francesa Agnès Varda fez em ‘Cléo das 5 às 7’. Enquanto Varda desconstrói a forma como a mulher é vista, Emerald Fennell faz o oposto disso e com um propósito semelhante – só que mais ousado.
A estética do filme é excessivamente feminina (Foto: Divulgação/Focos Features)
Se nos anos 1960, Varda mostrou que as mulheres poderiam ser donas de sua vida logo em sua estreia cinematográfica, o mesmo demorou para acontecer em Hollywood. O movimento “Me Too”, sem dúvida, deu uma guinada nisso. Não são apenas os roteiros que mudaram, mas também as premiações passaram a reconhecer o lugar feminino na indústria cinematográfica. ‘Bela Vingança’ é apenas o começo de talvez uma nova forma de trazer história femininas, não necessariamente sobre dar lições em homens, mas muito além disso. A discussão de pautas como abuso, aborto e padrões de beleza ainda precisa ser exaustivamente citada na cultura pop. A ideia não é se tornar maçante, mas sim parar de ser um choque, pois infelizmente são situações extremamente reais e corriqueiras. ‘Bela Vingança’ é um exemplo de que o cinema já passou da fase de repetir fórmulas, dá para falar de cotidiano com pautas mais realistas. Ainda que seja sensível falar dos temas citados, eles são necessários para que a sociedade deixe de reproduzir machismo. Infelizmente, o filme ainda não tem data de estreia confirmada no Brasil. Acompanhe no Filmelier para novas informações sobre o lançamento assim que disponíveis.

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Raíssa Basílio

Jornalista de cultura e entretenimento. Já passou pelo Papelpop, UOL e Revista Claudia escrevendo sobre beleza, moda, cinema, música e TV, e também trabalhou com produção na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Foi redatora do Filmelier.

Escrito por
Raíssa Basílio

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