‘Close’ reflete sobre a desconexão entre as pessoas, diz Lukas Dhont ‘Close’ reflete sobre a desconexão entre as pessoas, diz Lukas Dhont

‘Close’ reflete sobre a desconexão entre as pessoas, diz Lukas Dhont

Em entrevista ao Filmelier, durante sua passagem no Brasil, Lukas Dhont falou sobre a pressão de fazer ‘Close’, seu segundo filme

Matheus Mans   |  
24 de abril de 2023 13:11

Foi em novembro de 2022 que o cineasta Lukas Dhont, até então conhecido apenas pelo bom filme independente Girl, veio ao Brasil para apresentar seu novo trabalho: Close. Até então, o longa-metragem era uma atração de festivais ao redor do mundo e pouco se sabia quais eram as possibilidades que o filme alcançaria na temporada de premiações. Ou seja: quando o Filmelier conversou com Lukas, ainda estava longe a possibilidade da indicação ao Oscar de 2023.

O tempo passou e o filme se tornou um sucesso absoluto — perdeu na categoria de Melhor Filme Internacional para Nada de Novo no Front, mas se tornou um dos queridinhos de público da temporada. Agora, com o filme finalmente prestes a estrear na MUBI nesta sexta-feira, 28 de abril, voltamos para a entrevista feita em novembro. E ela não poderia ter envelhecido melhor: ele, com clareza, consegue mostrar o motivo do filme ser tão bem visto e celebrado.

Cena do filme Close
Personagens de ‘Close’ estão em fase de crescimento e aprendendo a lidar com sentimentos (MUBI)

“Acho que muitos dos nossos problemas atuais estão relacionados com essa desconexão”, explica Lukas, ao ser questionado pelo Filmelier sobre o nascimento do filme. Segundo ele, muitas das nossas dores nascem da chavinha que viramos durante a adolescência, quando a palavra “amor” some do vocabulário e deixamos de nos relacionar com verdade. É, enfim, a história de Close: dois amigos que se amava, mas que veem uma forte ruptura na adolescência.

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A seguir, confira a conversa completa com Lukas Dhont sobre Close, seu segundo filme (e o de maior sucesso):

Filmelier: Primeiramente, uma pergunta básica: de onde veio a ideia do filme Close?

Lukas Dhont: A ideia veio da leitura do livro Deep Secrets, da psicóloga Niobe Way, que entrevistou mais de 150 garotos nas idades entre 13 e 18 anos. Para os garotos de 13 anos, ela pediu para esses rapazes falarem sobre as suas amizades verdadeiras. E é muito, muito bonito ler esses depoimentos. Consegui sentir aquilo. E ainda tem a questão do vocabulário. Esses rapazes falam uns dos outros como se fossem histórias de amor. Fiquei profundamente tocado por isso. E é interessante que a psicóloga repete a pergunta para garotos com 16, 17 ou 18 anos, mas eles não repetem mais esse vocabulário. Eles não se atrevem mais a usar o amor para descrever uns aos outros. Então o que acontece é uma desconexão não apenas entre eles, mas também entre o que eles realmente sentem. E acho que muitos dos nossos problemas atuais estão relacionados com essa desconexão. Não ouvimos mais aquela voz interior com sentimentos verdadeiros. Quando li esses depoimentos, me senti muito conectado. Nessa idade, comecei a sentir fragilidade, a sentir intimidade com outros seres humanos, com garotos, mais especificamente. Achava que isso era algo que só eu sentia, mas percebi, então, que é algo comum, que vários de nós compartilhamos. O livro faz o pessoal ser universal, que é algo que a poesia também faz, por exemplo. Há um sentimento universal, uma tristeza universal…

Filmelier: O filme fala muito sobre identidade, sobre relacionamentos. Qual a similaridade com Girl, seu outro filme? Os temas conversam muito, não?

Lukas: Os dois filmes são histórias de pessoas em uma sociedade que dita as expectativas sobre eles, assim como normas, códigos, comportamentos. Quando eu era novo, sentia que o corpo que tinha, que nasceu comigo, não correspondia com as pressões que eu sentia que vinham junto dele. Havia muito conflito. Tanto em Close quanto em Girl, falamos da relação com os nossos corpos e com os sentimentos que nascem a partir disso. Acredito que os dois filmes são continuação de uma particularidade de personagens que dividem, a partir de discussões como gênero, sexualidade e identidade, na forma mais ampla da palavra. É uma vergonha que a gente compartimentalize tantas coisas nesse mundo, deixando-as menos compreensíveis. Consigo ver uma conexão entre os dois filmes.

Filmelier: Você sentiu muita pressão com Close após o sucesso de Girl?

Lukas: Meu Deus, nem sei como começar. Sim, senti. Mentiria se dissesse que não senti essa pressão. É desesperador, depois de Girl, senter na frente de uma folha em branco e não saber o que fazer. Não podia apenas entrar no Google e pesquisar um manual de como um diretor deve fazer um segundo filme (risos). O manual não está disponível, infelizmente. Mas ajudou muito, no meu processo, ler uma entrevista da Julia Ducournau. Ela disse que primeiro você precisa deixar seu primeiro filme para trás antes de fazer o segundo. Com isso, percebi que precisa ir mais devagar. Eu acho que quando finalmente fiz isso, coloquei algumas palavras no papel, pensando em falar sobre masculinidade… Mas aí depois que li esse livro, que já comentei, as coisas começaram a fluir muito melhor, bem mais rápido.

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