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Para o bem e para o mal, ‘Dupla Jornada’ é o típico filme de algoritmo
Ao tentar ser tudo para o maior público possível, o novo longa da Netflix acaba se tornando algo do qual você se esquecerá em poucos dias
Você, provavelmente, já ouviu falar da expressão “filme de algoritmo”. Basicamente, o termo é empregado em produções que utilizam o comportamento dos espectadores no streaming (ou, em último caso, nos cinemas) para juntar tudo que atraia o público em um único longa-metragem – criando, dessa forma, um sucesso “garantido”. Ainda que tente fugir dessa pecha, a Netflix é constantemente identificada com a tática – e ‘Dupla Jornada‘, estreia desta sexta (12), é mais um grande exemplo disso.
Não acredita? Vamos lá. Terror é um gênero que tem um público fiel, principalmente o gore (longas que espirram sangue para todo o lado)? Colocaram isso em ‘Dupla Jornada’. Vampiros são personagens que atraem fascínio? Estão lá, também. O público ama um filme de buddy cops na estética dos anos 1980, como ‘Máquina Mortífera’ e ‘CHiPs: O Filme’ (Top 10 global da Netflix outro dia)? Tá na mistura. Por cima, adicione um subenredo do relacionamento de um pai com a filha, para criar empatia com o público e ainda encaixar a produção no Dia dos Pais.
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Tem mais. Se a franquia ‘John Wick’ deu certo ao ser dirigida por ex-dublês, ‘Dupla Jornada’ leva a assinatura de J.J. Perry – estreante na função e que, veja só, fez as cenas de ação justamente de ‘De Volta ao Jogo‘. O elenco conta também com Jamie Foxx (que, vale lembrar, é um dos vilões do maior sucesso do cinema na pandemia, ‘Homem-Aranha: Sem Volta para Casa‘) e Snoop Dogg – trazendo mais um rosto conhecido e atraindo um outro perfil demográfico para o filme.
O grande problema é que nem tudo isso dá liga. Quer dizer, é incrível quando um filme consegue borrar as linhas que dividem os gêneros, criando algo improvável. ‘O Que Fazemos nas Sombras‘, por exemplo, faz a junção de vampiros, terror e comédia de forma impecável, dentro do subgênero terrir. Acontece que isso, normalmente, funciona quando empregado para o bem da história que é contada na tela. No caso de ‘Dupla Jornada’, tentam ser tudo, mas acabam com nada. O humor pouco funciona, enquanto os elementos de terror não dão medo nem fazem rir. Os buddy cops não possuem química, e olha que Dave Franco se empenha. Já a relação do personagem de Foxx com a filha (interpretada por Zion Broadnax, bem em cena) até que cria empatia, mas é resolvida de forma apressada. Já os vampiros… Veja bem: ao se escrever um roteiro que pega emprestado elementos fantásticos, é importante criar regras bem sólidas para isso – principalmente se pretende-se criar uma franquia. Não vale tudo, sob o risco de se quebrar a lógica interna do universo simplesmente para se resolver o conflito da trama. Advinha? Pois é, ‘Dupla Jornada’ faz exatamente isso, jogando fora em seu último terço regras importantes que tinha estabelecido para os vilões. A direção salva, então? Nem isso. J.J. Perry pode ser carregado de boas intenções, mas o cineasta traz uma mão extremamente acadêmica em sua direção. Pouco bebe do terror nas cenas de gore, não brinca com os elementos das cenas de ação ou atinge o pico do seu trabalho nos trechos de luta. Não há correlação nenhuma com o trabalho pelo qual Chad Stahelski e David Leitch (ambos de ‘John Wick: De Volta ao Jogo’) se tornaram conhecidos, com cenas de ação movimentadas (inspiradas nos animes), planos longos e aquela sensação de forte perigo enquanto o protagonista da vez empilha adversários. E olha que Stahelski é o produtor deste filme aqui. Ok, tudo isso faz parecer que ‘Dupla Jornada’ é o pior filme do mundo. Não é. Ainda que com falhas, suas quase duas horas de duração conseguem trazer algum entretenimento, com boas sacadas aqui e ali. Infelizmente, o roteiro não tira o melhor de Jamie Foxx (como, por exemplo, em ‘Django Livre‘ e ‘Em Ritmo de Fuga‘), mas a presença de Snoop Dogg compensa: é só o ator e rapper aparecer em cena, sem fazer nada, que um sorriso já nos vem ao rosto. Talvez o maior problema de ‘Dupla Jornada’ é que, nessa tentativa de ser tudo, acaba se tornando um entretenimento esquecível. Nem impacto negativo o filme causa. Está lá, simplesmente. Dois dias depois, você nem vai se lembrar direito do enredo. É uma pena, principalmente pensando que o orçamento da produção foi na casa dos US$ 100 milhões. Pode ser pouco para blockbuster de cinema, mas é bastante dinheiro para um filme de comédia de ação direto para o streaming – ainda mais para um que tenta ter justamente a estética dos filmes B de gore. Está na hora da Netflix entender que menos é mais. Não só ter menos produções originais, focando nas efetivamente boas, mas percebendo também que enredos mais simples e sem tantos elementos funcionam melhor do que tentar ser tudo para todo mundo. Afinal, lá no começo, esse era o objetivo do algoritmo: achar algo perfeito para você assistir, e não fazer todo mundo assistir às mesmas coisas.