Crítica de ‘Todos Nós Desconhecidos’: curando a criança interior Crítica de ‘Todos Nós Desconhecidos’: curando a criança interior

Crítica de ‘Todos Nós Desconhecidos’: curando a criança interior

‘Todos Nós Desconhecidos’ utiliza elementos modestos de fantasia em uma trama sobre amor, dor e cura

Lalo Ortega   |  
5 de março de 2024 17:09

E se pudéssemos conhecer nossos pais quando eram jovens (ou, pelo menos, na mesma idade que temos agora, seja qual for)? Claro, existem filmes como De Volta para o Futuro que respondem a essa pergunta através da comédia. Nesse sentido, sua contraparte teria que ser Todos Nós Desconhecidos – drama que chega aos cinemas do Brasil neste 7 de março.

Aí terminam as semelhanças. Como saberão aqueles que ouviram falar sobre o filme (ou estão familiarizados com a capacidade de Paul Mescal de partir nossos corações coletivos), aqui o assunto vai muito além da graça de ver papai e mamãe quando não sabiam nada sobre a vida.

Todos Nós Desconhecidos: histórias de homens quebrados

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O filme, dirigido e escrito por Andrew Haigh (45 Anos, Me Chame Pelo Seu Nome), foca em Adam (Andrew Scott), um solitário roteirista que vive isolado em um prédio nos arredores de Londres. O enorme edifício está deserto: seu único vizinho é Harry (Mescal), que faz uma tentativa embriagada de conhecê-lo e se aproximar. Adam, no entanto, o rejeita: não está disposto a se abrir para ninguém.

No entanto, ao ficar preso com um roteiro, decide abandonar sua fortaleza da solidão por um dia e viajar para visitar a casa onde cresceu, antes de seus pais falecerem. Mas ao chegar, para sua surpresa, seu pai (Jamie Bell) e sua mãe (Claire Foy) o recebem, exatamente como ele se lembra. Eles o reconhecem como seu filho e o convidam para jantar. Ao voltar para seu apartamento, Adam decide começar a se abrir com Harry.

Em Todos Nós Desconhecidos, um jovem conhece seus pais, que morreram quando ele era criança (Crédito: Searchlight Pictures)
Em Todos Nós Desconhecidos, um jovem conhece seus pais, que morreram quando ele era criança (Crédito: Searchlight Pictures)

Todos Nós Desconhecidos não se esforça para esclarecer os comos ou os por quês, se o que acontece é uma visão, um sonho, uma alegoria ou a realidade do personagem. Não importa, porque o objetivo é outro. Haigh consegue dar credibilidade ao assunto com uma direção sólida de seus atores, repleta de expressões sutis e emoções profundas para percorrer suas verdades desconhecidas. Adam, como estabelecido desde o início, é gay. Há traumas implícitos em sua afirmação, e a aceitação externa não é tão fácil.

Encerrando a tristeza infinita

O que Adam encontra talvez não seja tanto aceitação, mas sim compreensão, em seu vizinho e eventual parceiro romântico. Mas primeiro eles precisam se abrir um para o outro, e Haigh escolhe retratar seu isolamento emocional com elegantes metáforas visuais, que, embora sejam frias em suas composições e cores, não são em sua emotividade. São personagens que vivem isolados pelos limites de suas janelas, viajam acompanhados apenas por seus próprios reflexos no elevador, ou presos em carros separados do trem. Aos poucos, os espaços poderão se abrir, as cores serão mais quentes.

Todos Nós Desconhecidos nos apresenta a ideia de que, para abrir o coração, primeiro é preciso curar o nó que o prende. Isso não é fácil quando o nó é feito de repressões tácitas, medos crônicos, traumas escolares e arrependimentos associados à própria essência do ser, e que parecem permanecer para sempre. O que será pior: perder os pais antes que descubram a orientação sexual do filho, ou poder transcender a morte para enfrentar o medo de confessar e ser rejeitado?

Todos Nós Desconhecidos está cheio de belas metáforas visuais (Crédito: Searchlight Pictures)
Todos Nós Desconhecidos está cheio de belas metáforas visuais (Crédito: Searchlight Pictures)

A beleza do filme reside em todas essas perguntas hipotéticas que, visão ou não, metáfora ou não, sonho ou não; devem se consolidar na realidade como uma reconciliação no próprio coração. Todos Nós Desconhecidos nos lembra que é possível curar, mesmo quando os outros já se foram.

Haigh consegue aterrissar seu relato fantástico graças às profundas emoções de seus personagens, com maestria particular de Andrew Scott, que carrega o filme em seus ombros. Essa emotividade é quase quebrada pela forma como o diretor decide retratar dois momentos específicos do terceiro ato, quase roçando o lovecraftiano.

No entanto, em geral, sua imensa beleza sai bem dessas decisões um tanto questionáveis. Não esqueça de levar algo para secar as lágrimas.

Todos Nós Desconhecidos chega aos cinemas em 7 de março.

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