O medo da variante delta inquieta Hollywood O medo da variante delta inquieta Hollywood

O medo da variante delta inquieta Hollywood

Aumento de casos da covid-19 pode levar a novos adiamentos nos cinemas – e dar um novo gás para os lançamentos simultâneos, incluindo no Premier Access

18 de agosto de 2021 18:09
- Atualizado em 20 de agosto de 2021 17:22

“Os rumores sobre a minha morte foram terrivelmente exagerados”, teria dito o Premier Access, do Disney+, se fosse um ávido leitor da obra de Mark Twain. É que o serviço premium de aluguel de filmes no streaming, com estreia simultânea com os cinemas, não teve o seu fim declarado pela Disney – e pode ganhar uma nova vida.

Tudo isso dentro de um novo cenário da pandemia, que vem se desenhando nos últimos dias e terá certamente impacto nos próximos lançamentos dos grandes estúdios. Prepare-se para mais grandes mudanças.

Premier Access: Ninguém disse que 'Jungle Cuise' seria o último lançamento da Disney no modelo (Crédito: reprodução / Disney)
Ninguém disse que ‘Jungle Cuise’ seria o último lançamento da Disney no Premier Access… (Crédito: reprodução / Disney)

Se você acompanha minimamente o noticiário, já viu que, neste momento, estamos vivendo uma espécie de pandemia dentro da pandemia. O medo da covid-19 convive conosco desde março de 2020, mas, nos últimos meses, a chamada variante delta do vírus SARS-CoV-2 ganhou protagonismo – justamente por ser mais contagiosa do que a cepa original e suas variantes.

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É por causa dessa variante que, mesmo com o avanço da vacinação nos EUA e em outros países, há ainda um grande número de infectados pelo vírus. Parte da Austrália e a Nova Zelândia estão, neste momento, em lockdown, enquanto países como Japão, Coreia do Sul e México informam alta de casos.

Isso é um problema porque os grandes estúdios confiaram bastante no avanço da imunização da população para, finalmente, haver menos restrições de circulação e convencerem o público a ficar por duas horas trancado em uma sala com outras pessoas. A lucratividade de um filme é uma equação complicada e queimar um lançamento para ter menos espectadores pode ser um tiro no pé.

Dormindo com o sonho, acordando com o pesadelo

A confiança de que a solução da pandemia estava no horizonte havia tomado Hollywood no final do primeiro semestre. Depois de garantir lançamentos simultâneos no streaming e nos cinemas, de adiar indefinidamente lançamentos ou abrir mão das produções para Netflix e concorrentes, os estúdios estavam marchando para um novo modelo.

Nele os longas voltariam a ser exclusivos dos cinemas, mas apenas por 45 dias – chegando aos streamings (seja do próprio grupo ou de terceiros) depois desse período. Porém, tudo mudou rapidamente com o avanço da delta.

De acordo com The Hollywood Reporter, o “conforto” do público em uma sala de cinema, medido pela National Research Group, caiu de 81% em julho para 64% no último dia 16 de agosto.

O medo, agora, é que os cinemas voltem a ficar assim, abandonados (Crédito: Chris Marchant / Flickr)

Mesmo que ainda não haja um endurecimento das medidas sanitárias nos cinemas nos EUA, apenas o retorno da obrigatoriedade da máscara, essa perda de confiança foi o suficiente para, nas palavras do THR, fazer os estúdios “piscarem”: novos adiamentos em lançamentos voltaram a ocorrer.

A Paramount Pictures e Sony foram dois dos estúdios que já reagendaram as próximas estreias, ainda que com poucos dias de diferença, em um calendário que há muito virou um jogo de Batalha Naval – com tiros para todos os lados e poucos acertos.

“Se eu soubesse há seis semanas o que sei agora, eu teria movido tudo para o começo do próximo ano”, disse um executivo ouvido pelo veículo americano. Se antes ninguém queria adiar nada para 2021, agora a possibilidade está na mesa.

Até este momento, o calendário do segundo semestre está uma verdadeira aglomeração. Temos ‘Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis’ (2/9), ‘Venom: Tempo de Carnificina’ (16/9), ‘007: Sem Tempo para Morrer’ (7/10), ‘Eternos’ (5/11), ‘Duna’ (22/10), ‘Ghostbusters: Mais Além’ (11/11), ‘Top Gun: Maverick’ (18/11), ‘Amor, Sublime Amor’ (10/12), ‘Homem-Aranha: Sem Volta para Casa’ (16/12) e ‘Matrix 4’ (22/12), entre outros títulos. Todas as datas são para o Brasil.

As próximas semanas, talvez dias, serão importantíssimos para saber se esse castelo de cartas continuará de pé.

Ryan Reynolds em imagem promocional de 'Free Guy': o filme deixou os executivos de Hollywood confiantes (Crédito: divulgação / 20th Century Studios)
Ryan Reynolds em imagem promocional de ‘Free Guy’: o filme deixou os executivos de Hollywood confiantes (Crédito: divulgação / 20th Century Studios)

De um lado, há o óbvio avanço da covid. Será que as autoridades vão conseguir convencer quem não se vacinou, até agora, a tomar a suas respectivas doses? Haverá um aumento exponencial de casos, ou uma estabilidade (ainda que em um platô alto)? No mercado fora dos EUA, teremos uma ampliação no número de vacinados? E, por fim, será que novas variantes podem surgir?

Do outro está o próprio mercado de cinema. ‘Free Guy‘ está tendo uma janela de exclusividade nos cinemas. Se o longa estrelado por Ryan Reynolds não sofrer com a “síndrome covid” (ou seja, uma drástica queda de bilheteria na segunda semana, algo que virou comum em tempos de pandemia e lançamentos simultâneos), será um grande resultado.

Por enquanto, o título – que fez até aqui US$ 53 milhões de bilheteria, de acordo com o Box Office Mojo – está deixando a indústria otimista.

‘Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis’ é outra produção da Disney que será exclusiva dos exibidores por 45 dias – e mais uma oportunidade de “teste” do público, como disse o CEO da Disney, Bob Chapek, em uma declaração que foi erroneamente entendida por muita gente.

O retorno do Premier Access

É aqui que entra o Premier Access. Em nenhum momento a Disney enterrou o modelo de lançamento, como reportado em alguns veículos da imprensa brasileira. O método apenas não foi adotado em ‘Free Guy’ por questões contratuais da antiga 20th Century Fox, enquanto ‘Shang-Chi’ aparentemente sofreu resistência da própria Marvel Studios.

De qualquer forma, nenhuma das duas mudanças teve relação com o processo de Scarlett Johansson com a Disney – ainda que essa seja, sim, uma nova preocupação para os estúdios.

Acontece que, com o avanço da variante delta, aos grandes distribuidores ficam três alternativas: lançar o filme do mesmo jeito, mesmo que com prejuízo; adiar novamente a data; voltar a explorar os lançamentos simultâneos.

“Nós estamos reagindo para a situação muito fluída em termos de mercado”, disse Chapek na última conferência da Disney com investidores, no começo de agosto. “Nós vamos continuar utilizando todas opções disponíveis para seguir em frente, aprender com a percepção de mercado ganha com cada lançamento, e inovar de acordo enquanto estamos fazendo o que acreditamos ser o melhor interesse para o filme e o melhor interesse para os nossos investidores.”

'Eternos' pode, ainda, ser lançado no Premier Access: tudo depende do que acontecer nas próximas semanas (Crédito: divulgação / Disney)
‘Eternos’ pode, ainda, ser lançado no Premier Access: tudo depende do que acontecer nas próximas semanas (Crédito: divulgação / Disney)

Sem citar ‘Eternos’ pelo nome, o executivo falou sobre a produção da Marvel Studios que, até o momento, não está prevista para o Premier Access: “Temos falado que estamos sendo muito flexíveis para fazer todas as mudanças de última hora possíveis, tendo em vista o que vemos no mercado. Nada está escrito em pedra.”

“Estamos sendo muito flexíveis.
Nada está escrito em pedra”

Lendo nas entrelinhas: em um cenário com pessoas com medo de sair de casa e com uma agenda complicada pela frente, voltar lançar filmes no streaming por R$ 69,90 (US$ 29,99 nos EUA) é, sim, um caminho plausível.

O que é necessário levar em conta nesse cenário é o fator pirataria. O lançamento simultâneo também coloca, quase que instantemente, o filme em alta qualidade por meios ilegais na internet – um dos motivos que tem levado à queda de faturamento a partir da segunda semana.

Isso tudo, claro, vale para a Disney. A Warner Bros. já tinha tomado, ainda em 2020, a decisão de ter lançamentos simultâneos nos cinemas e no HBO Max durante todo o ano de 2021. Dessa forma, o estúdio ganha algum respiro antes de migrar para a já acordada janela de exclusividade de 45 dias com os cinemas, que valerá em 2022.

Paramount (que nunca apostou no lançamento simultâneo), Sony (que não tem streaming próprio no grupo), Universal e MGM seguem sendo incógnitas. Paramount e Sony já venderam, anteriormente, seus filmes para Netflix e Amazon Prime Video, por exemplo. O acordo do tipo mais recente envolveu ‘Hotel Transilvânia 4: Transformonstrão’, que perdeu a janela nos cinemas de vez.

O certo é que, para 2022, os estúdios querem mesmo se distanciar dos lançamentos simultâneos entre cinemas e streamings. Só precisam, mesmo, combinar com o vírus.

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