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‘Cow’, da MUBI, mostra o doloroso caminho do leite de vaca

Quando vamos no supermercado, compramos o leite acondicionado em uma caixinha ou, em alguns casos, em uma garrafa plástica. O peixe pode vir em bandejas de isopor, assim como bifes bovinos e suínos. É um processo que, quando repetido inúmeras vezes, “coisifica” os animais responsáveis por esses alimentos. Não vemos ali o porco, a vaca, o boi, o peixe ou o frango; vemos objetos. E é justamente contra esse processo que surge o filme ‘Cow’ – que estreia nesta sexta, 11, na MUBI.

Dirigido por Andrea Arnold, do drama ‘Docinho da América’, o documentário acompanha o dia a dia de Luma. Uma pessoa? Nada disso. Luma é uma vaca leiteira da raça Holstein-Frísia – com manchas pretas na pele branca, também conhecida como vaca holandesa. Acompanhamos sua vida: desde quando dá luz à um bezerro, passando pela separação brusca de sua cria e até chega na exploração de seu corpo, com o leite sendo retirado a todo o custo.

Vaca Luma é a protagonista do documentário ‘Cow’, experiência dolorosa e necessária (Crédito: Divulgação/MUBI)

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A câmera de Arnold, como já tinha mostrado uma habilidade naturalista em ‘Docinho da América’ e até mesmo no menos conhecido ‘Aquário’, coloca o espectador direto na jornada do animal. Enquanto a indústria alimentícia coisifica a vaca, Arnold a humaniza. Até mesmo o tratamento dos fazendeiros, donos da posse de Luma, aumentam essa pessoalização da vaca: ela escuta música, é tratada pelo nome e não por números, sofre demais com a cria distante.

Além de ‘Cow’

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Esse movimento do cinema de ‘Cow’ é algo que vai além do filme da vaquinha Luma. Entre 2013 e 2014, dois filmes trouxeram debates importantes sobre animais invisibilizados: ‘Blackfish‘, documentário sobre os maus tratos aos animais no parque Sea World, e ‘Cowspiracy’. Este último, muito indicado por veganos e vegetarianos, talvez tenha sido o primeiro a abrir o debate sobre os efeitos da agropecuária intensiva no meio ambiente e na vida dos animais. Depois disso, a discussão esfriou nos cinemas. Ganhou alguma relevância com ‘Okja‘, filme de ficção dirigido por Bong Joon-ho (‘Parasita’) e só. No entanto, nos últimos anos, os animais passaram ao papel central nesse debate. ‘Super Size Me 2: Holy Chicken!‘, por exemplo, mostrou detalhes dos frangos na rotina da indústria alimentícia. Já ‘Seaspiracy‘, mais recente, de 2021, mergulha nos perigos da indústria da pesca – filme que causa um desconforto absoluto. No entanto, ‘Cow’ coloca a discussão em outro nível. ‘Blackfish’, ‘Super Size Me 2’ e ‘Seaspiracy’ colocam pessoas no centro da discussão: são elas que verbalizam os abusos e, algumas vezes, são o foco das lentes dos cineastas. Mas o filme de Andrea Arnold faz diferente: Luma, a vaquinha que conquista a audiência com sua doçura inesperada, é o começo, meio e fim. Os fazendeiros são apenas sombras; Luma rouba a atenção para si durante toda a história.

Longe do panfletário

E é neste ponto que entra o principal ponto positivo de ‘Cow’: não há absolutamente nada de panfletário ou de filme-propaganda nesta produção de Arnold. Por mais bem intencionados que sejam, ‘Cowspiracy’, ‘Blackfish’, ‘Super Size Me 2’ e ‘Seaspiracy’ cumprem uma agenda, uma ideia pré-concebida dos seus diretores e roteiristas. Funcionam e, por isso, continuam em alta entre o público. Mas não há uma verdade e naturalidade chocante; há fatos, dados, ideias.
‘Cow’, enquanto isso, deixa as coisas acontecerem, simplesmente. A cineasta não quer exatamente provar uma tese, um ponto, mas mostrar uma realidade. Não é à toa que a câmera de Arnold fica muitas vezes no ombro de Luma: ela quer colocar tudo a partir de seu olhar, suas emoções, seus sentimentos. Vemos a dificuldade de caminhar quando a teta está cheia de leite, a preocupação com o bezerrinho, a ausência de qualquer tipo de estímulo no seu dia a dia. Com isso, questões surgem normalmente. Há maneira da indústria leiteira não ser uma vilã na vida de uma vaca? Será que não pode tratar bem esses animais? Será que a vaca, e qualquer outro animal que vive, respira e existe, não tem direito do que sentir com seu corpo? Luma é explorada, das mais variadas maneiras, e parece que não há fim. Depois de Luma, o bezerro continuará nesse processo. É uma máquina. E Arnold, sem gritar, questiona: até quando isso?

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Matheus Mans

Jornalista especializado em cultura e tecnologia, com seis anos de experiência. Já passou pelo Estadão, UOL, Yahoo e grandes sites, sempre falando de cinema, inovação e tecnologia. Hoje, é editor do Filmelier.

Escrito por
Matheus Mans

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