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‘Star Wars’: 25 anos de ‘Episódio I: A Ameaça Fantasma’

Há não muito tempo (cerca de 40 anos), a galáxia muito, muito distante era um fenômeno comparativamente pequeno: Star Wars era a história de Luke Skywalker (Mark Hamill) e a luta da Aliança Rebelde contra o malvado Darth Vader e o Império Galáctico, ao longo de uma trilogia. Entre brinquedos, quadrinhos e especiais de TV, a criação de George Lucas veio e foi, cultivando seu sucesso – e permanência geracional – durante os anos seguintes.

Mais de 15 anos se passariam para retornarmos a esse universo com Star Wars – Episódio I: A Ameaça Fantasma (Star Wars – Episode I: The Phantom Menace). E essa nem mesmo era a intenção original de Lucas, para ser honesto.

“Caso tenham esquecido, Lucas fez Star Wars [hoje intitulado Uma Nova Esperança], O Império Contra-Ataca e O Retorno de Jedi como a segunda trilogia em uma saga de nove filmes”, escreveu a Variety em 1993, quando a produção da nova trilogia de prequelas foi anunciada.

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Passaram-se 10 anos sem mais possibilidades de ver Star Wars a não ser reproduzi-las em VHS até desgastar as fitas. Tinham sido os filmes mais grandes do planeta, mas uma década mais tarde, era necessário lembrar um pouco ao público que eles tinham sido. Era um mundo diferente para o cinema e para a cultura audiovisual como um todo. Uma trilogia de filmes estava mais próxima em conceito de uma saga cinematográfica épica sobre múltiplas gerações de uma família (como O Poderoso Chefão), do que das franquias cinematográficas ou “universos” interconectados por múltiplas entregas fílmicas e televisivas, cada vez mais grandes, ambiciosas e, em consequência, difíceis de assistir. Isso foi antes da trilogia de prequelas de Star Wars. E o Episódio I: A Ameaça Fantasma estava no centro de tudo.

História e legado de Star Wars – Episódio I: A Ameaça Fantasma

A criação: a trilogia que não deveria ter sido

Para nenhum fã da saga de George Lucas será surpresa saber que a filmagem da Star Wars original foi um desastre: apesar do sucesso de seu filme anterior, Loucuras de Verão (American Graffiti), sua visão foi constantemente questionada, o orçamento inflou, houve problemas com adereços e efeitos visuais, e o cronograma de pós-produção foi adiado. A visão e o sucesso do produto final são inquestionáveis, mas é verdade que, na essência, Lucas tinha um caos em suas mãos. Boa parte disso foi sua culpa: ele havia criado um pano de fundo para seus personagens e uma mitologia tão vasta e extensa, que ele mesmo sabia que seria impossível contar tudo em um único filme (o roteiro era tão denso e a estrutura do filme tão desajeitada que Star Wars foi, famosamente, “salvo na sala de edição”). Mas ali já estavam as sementes do que eventualmente seria o Episódio I: A Ameaça Fantasma. Lucas tinha escrito toda a história de Anakin Skywalker antes de se queimar em um vulcão, cair no Lado Negro da Força e se tornar Darth Vader. O primeiro filme já havia estabelecido que Obi-Wan Kenobi (Alec Guinness) tinha sido seu mestre, que eles haviam lutado juntos em uma “guerra dos clones” e que Anakin havia traído os Jedi. No entanto, apesar de ter escrito história suficiente para nove filmes, Lucas perdeu o interesse após o lançamento de O Retorno de Jedi em 1983. O cineasta rejeitou a ideia de retornar à sua ópera espacial, até que os quadrinhos da editora Dark Horse e os romances de Timothy Zahn mostraram a paixão que persistia em torno de Luke Skywalker e companhia.
Episódio I: A Ameaça Fantasma introduziu uma versão muito nova do universo de George Lucas (Crédito: Lucasfilm)
Isso, aliado aos enormes avanços das imagens geradas por computador (CGI), despertou seu interesse em contar novas histórias, mais épicas, elaboradas e ambiciosas. O resultado final foi visualmente deslumbrante e inovador para o público da época, embora a resposta, ao mesmo tempo, fosse mista.

De Jar-Jar aos pods: as críticas à A Ameaça Fantasma

O filme teve um sucesso indiscutível: entre um caos generalizado que implicou revenda de ingressos a preços absurdos, absenteísmo laboral massivo e uma campanha promocional que resultou na criação do evento Star Wars Celebration (que ocorre anualmente até hoje); Episódio I: A Ameaça Fantasma se tornou o segundo filme mais lucrativo a nível mundial de sua época (só superado por Titanic). No entanto, tanto a crítica especializada quanto os fãs tiveram comentários mistos em comum. Muitos deles são bem conhecidos: a suposta “infantilização” da franquia, em particular devido ao personagem de Jar-Jar Binks (interpretado por Ahmed Best, que anos depois confessaria ter considerado o suicídio diante do ódio generalizado ao seu trabalho no filme). Os fãs que haviam crescido com a saga dos samurais espaciais e dos Ewoks já eram adultos, e talvez esperassem algo diferente. Episódio I: A Ameaça Fantasma também foi criticado por sua notável dissonância com a trilogia original. Primeiro, pelo tom e conteúdo: onde antes havia aventuras e um sarcástico vaqueiro espacial, agora havia uma estoica Ordem Jedi e um senado intergaláctico debatendo sobre rotas de comércio. Havia lacunas na narrativa, também: em O Império Contra-Ataca, Obi-Wan afirmava que Yoda tinha sido seu mestre, e agora tinha que explicar quem diabos era Qui-Gon Jinn (Liam Neeson). Visualmente, o contraste era maior: no universo da narrativa, o Episódio I se situava cerca de 30 anos antes da trilogia original. No entanto, a visão de Lucas e sua ambição em esticar os limites das possibilidades do CGI, faziam parecer tudo mais novo, avançado, limpo. Isso também resultou em excessos criticáveis: inspirada em Ben-Hur, a corrida das naves pods foi, de longe, a sequência mais espetacular do filme, mas foi muito criticada por seu quase nulo aporte ao relato, quebrando o ritmo da narrativa e inflando o metragem.
O jovem ator Jake Lloyd foi um dos aspectos mais criticados injustamente do filme (Crédito: Lucasfilm)
A Ameaça Fantasma foi o começo de uma era polêmica para Star Wars: Jar-Jar seria deixado de lado, mas não assim o tom mais solene definido por intrigas políticas, a tragédia de Anakin Skywalker (interpretado de forma irregular por Jake Lloyd como criança e Hayden Christensen como jovem adulto), guerras separatistas e diálogos terríveis sobre areia que se mete em lugares incômodos. Os fãs debateriam por mais de uma década sobre sua reputação na saga e a ordem “correta” para assistir a todos os filmes, inventando métodos tão ortodoxos quanto o “Ordem Machete”. Atrás das câmeras, nem tudo ia tão bem para seus atores. A atuação do pequeno Jake Lloyd – de 10 anos de idade quando o filme foi lançado – foi um dos pontos mais criticados da produção, submetendo o ator mirim a um nível de atenção midiática e abuso psicológico que o danificou para sempre. Exceto atores mais consagrados como Neeson – ou com mais sorte, como Ewan McGregor no papel do jovem Obi-Wan –, Star Wars também seria o início dos problemas para seu outro nome principal: Natalie Portman. Interpretou o papel de Padmé Amidala na trilogia completa, mas isso quase matou sua carreira quando apenas decolava: “Estive no filme mais lucrativo da década, e nenhum diretor queria trabalhar comigo”, disse Portman à New York Magazine (via The Things).

Reavaliação retrospectiva

Para muitos fãs, A Ameaça Fantasma e suas sucessoras na trilogia – O Ataque dos Clones e A Vingança dos Sith – existiram por muito tempo como um fracasso de Lucas no pior dos casos, e como um lembrete das virtudes da trilogia original no melhor. O tempo passou, como deve fazer, e aconteceram duas coisas: a Disney comprou a Lucasfilm… e as crianças que cresceram com as prequelas se tornaram adultos. No caminho, Star Wars deixou de ser uma mera saga de filmes: aos usuais quadrinhos e romances, somaram-se videogames, spin-offs de televisão animada (The Clone Wars, Star Wars Rebels) e live action (como Ahsoka, The Mandalorian), além de uma trilogia de sequências e a promessa de novas produções para o cinema e as telas do lar por igual. “Tudo o que ouvíamos era o lado crítico das coisas”, lembrou Ewan McGregor em 2022 a respeito do lançamento das prequelas, em uma conversa com a GQ a propósito de seu protagonismo na série Obi-Wan Kenobi. “Essa era a única voz que eu me lembro de ter ouvido, e [os filmes] não agradaram”.
Com o passar dos anos, a popularidade das prequelas cresceu e sua história foi expandida (Crédito: Lucasfilm)
“Admiro George [Lucas] por ter tentado fazer algo diferente com elas. Ele não se propôs a fazer outras três películas de Star Wars que se sentissem como as originais. Eu respeitei isso, acho que isso requer coragem e é interessante”, acrescentou o ator. E concluiu explicando por que acredita que não foram bem recebidas na época, mas agora são: “Acho que os críticos só queriam sentir como se tivessem sete ou oito anos de novo, e não conseguiram isso. E eu fiquei com essa reação por anos e anos, e tive que conhecer muita gente [que cresceu com a nova trilogia] para perceber o quão importantes nossos filmes foram para eles”. Assim, talvez, o Episódio I: A Ameaça Fantasma tenha um lugar mais confortável e amigável hoje no cânone da extensa saga de Star Wars. Um ao qual, talvez, suas sucessoras possam aspirar algum dia. Porque, agora sob o controle da Disney, chegaria a trilogia de sequências, inaugurada em 2015 por O Despertar da Força, um passar de bastão dos atores originais para uma nova geração: Daisy Ridley, John Boyega e Oscar Isaac. A nova trilogia de Star Wars provocou um curioso déjà vu em relação à resposta do Episódio I: A Ameaça Fantasma. Fãs – da trilogia original e das prequelas – criticaram as desvios da narrativa em relação ao espírito original da saga. A história da cultura pop é cíclica, como poesia, não é, George?

Star Wars – Episódio I: A Ameaça Fantasma voltará à cartaz no dia 1 de maio em comemoração ao seu 25º aniversário. Compre seus ingressos para assistir nos cinemas.

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Lalo Ortega

Lalo Ortega é crítico e jornalista de cinema, mestre em Arte Cinematográfica pelo Centro de Cultura Casa Lamm e vencedor do 10º Concurso de Crítica Cinematográfica Alfonso Reyes 'Fósforo' no FICUNAM 2020. Já colaborou com publicações como Empire en español, Revista Encuadres, Festival Internacional de Cinema de Los Cabos, CLAPPER, Sector Cine e Paréntesis.com, entre outros. Hoje, é editor chefe do Filmelier.

Escrito por
Lalo Ortega

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