‘Escrevendo com Fogo’ indicado ao Oscar “é um momento absurdo para a Índia”, diz diretora
O Oscar 2022 acontece amanhã, 27, e a maioria dos indicados já está disponível no Brasil. Na semana passada, foi a vez de ‘Escrevendo com Fogo’ ser lançado nas plataformas de streaming. O filme, que está concorrendo à estatueta de Melhor Documentário na maior premiação do cinema mundial, é a primeira indicação da Índia na categoria.
Com direção da dupla Sushmit Ghosh e Rintu Thomas, o longa-metragem acompanha a equipe de redação do Khabar Lahariya formada por mulheres Dalit (consideradas ‘intocáveis’, sendo excluídos do sistema de castas indianas).
O documentário traz discussões muito pontuais sobre como é ser mulher e jornalista na Índia. Ao longo de cinco anos, Sushmit Ghosh e Rintu Thomas finalizaram este projeto e, agora, colhem os louros desse trabalho. Na nossa entrevista exclusiva com a dupla, a felicidade era nítida nos olhos.
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Quando o papo começou, Thomas comentou que estava cansada, mas ver a empolgação com seu filme fazia tudo valer a pena.
“Como você pode notar pelas nossas expressões, ainda estamos processando o quão gigantesco é esse acontecimento. Eu não sei se já absorvemos essa informação”, disse a cineasta quando questionada sobre a nomeação ao prêmio da Academia. “Quando a notícia saiu na Índia, recebemos uma aprovação muito grande. Mal consigo lembrar da última vez que o país ficou tão empolgado com um documentário. Então, eu gostaria de dizer que é um momento absurdo para nós como pessoas, cineastas, pela nossa produtora e também, claro, pelo nosso país. Em resumo, ainda estamos processando”, completou.
O marco indiano
Essa é a primeira vez que um longa-metragem documental é indicado ao Oscar na Índia e os diretores não poderiam estar mais lisonjeados pelos reconhecimento da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
“Na história da Índia, apenas quatro filmes foram indicados para o Oscar, o primeiro foi na década de 1950 e é um filme de ficção, e os outros dois também eram ficções, então esse é o primeiro longa-metragem documental indicado para um Oscar”, disse Sushmit Ghosh. “Isso abre espaço para diálogos sobre a indústria da Índia, porque não há nenhum sistema apoiando os diretores de documentários e o que podemos fazer para realmente mudar isso. Então, eu acredito que esse filme poderá gerar debates e abrir novas perspectivas para futuros documentaristas vindos da Índia”, completou ele. Por mais que a indústria cinematográfica indiana seja uma das maiores do mundo, faltam recursos para os cineastas focado em documentários e pautas marginalizadas. “Essa é a ironia da Índia, nós somos um dos maiores mercados cinematográficos do mundo, temos Bollywood, mas não temos nenhum tipo de sistemas de recursos para documentários e cineastas independentes. Não há fundos, investimentos e nem nada, então é um grande desafio. Mas eu acredito que faz parte das configurações de cineastas documentais enfrentar desafios, então tem sido um exercício de paciência para nós.”
‘Escrevendo com Fogo’ não deu só voz às mulheres Dalit, mas também a outras pessoas que querem ingressar no cinema. “Grande parte das ligações que recebemos sobre nosso documentário vieram de dentro e fora da Índia dizendo que agora eles estão esperançosos pois agora eles sabem que cineastas independente não vivem apenas nos Estados Unidos e na Europa, e isso os inspirou pois agora eles sentem que têm o poder para fazer seus filmes, produzir e distribui-los”, compartilhou a diretora. “Então é preciso uma faísca para começar a mudança, mas o fato que esse filme existe e tem uma comunidade imensa construída em cima disso é um passo gigantesco. Nós fomos os primeiros, mas espero que não sejamos os últimos. A porta foi aberta”, concluiu.
Jornalista de cultura e entretenimento. Já passou pelo Papelpop, UOL e Revista Claudia escrevendo sobre beleza, moda, cinema, música e TV, e também trabalhou com produção na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Foi redatora do Filmelier.