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Entenda o final de ‘Estou Pensando em Acabar com Tudo’, novo filme da Netflix

Quando foi anunciado que Charlie Kaufman iria comandar o filme ‘Estou Pensando em Acabar com Tudo‘, estreia da Netflix desta sexta-feira, 4, a preocupação foi grande. Afinal, o livro original dessa história, escrito por Ian Reid, é complexo, estranho, caótico. Como levar algo assim pras telas?

O fato é que o longa-metragem, que já pode ser conferido na Netflix, surpreendeu e vai surpreender muita gente — e pelos mais variados motivos. A começar pela aparente simplicidade da trama. Nela, um casal de namorados (Jesse Plemons e Jessie Buckley) vai visitar os pais do rapaz.

Kaufman comanda um thriller psicológico que se arrisca no drama e no suspense para surpreender (Crédito: Divulgação / Netflix)
E o que era pra ser uma viagem tranquila e banal acaba ganhando contornos bizarros. Nada é normal, convencional, simples, compreensível.

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É a típica história de Kaufman, conhecido pelos roteiros de ‘Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças’ e ‘Quero Ser John Malkovich‘. Aqui, assumindo a direção como em ‘Anomalisa’, ele eleva acontecimentos banais ao mais perturbador possível, sem sair do drama familiar psicológico. Assim, com isso, pipocam questionamentos: o que faz os pais (brilhantemente interpretados por Toni Collette e David Thewlis) agirem de maneira tão estranha? Por que as roupas dos personagens mudam constantemente? O tempo é real? Por que a namorada é tão inconstante?

Psicologia de Kaufman

O grande ponto de ‘Estou Pensando em Acabar com Tudo’, e que é a chave para compreender o filme, está na psicologia tão abordada nas obras de Kaufman. E a partir daqui, caro leitor, fica o aviso: conforme o texto for avançando, os spoilers serão inevitáveis. Se ainda não viu o filme, primeiro assista e retorne aqui depois! Mas voltando ao que estávamos falando. Em ‘Anomalisa’, o cineasta falou sobre depressão como poucos. ‘Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças’ nos mergulha na vida de um casal desiludido, sem esperanças. Já em ‘Adaptação.‘, surge uma crise existencial com ansiedade. Assim, por isso, não dá para esperar que ‘Estou Pensando em Acabar com Tudo’ não fale sobre psicologia. Mais: que não tenha um viés triste, depressivo. Para isso, a chave é compreender o personagem de Jesse Plemons (‘A Noite do Jogo‘) como o protagonista, e não a tal namorada.
Mais do que um casal sem rumo, encontramos neste filme de Kaufman uma história sobre um homem sozinho, desiludido, imaginando a sua vida. A casa dos pais nada mais é do que sua imaginação a partir da figura de Jake idoso, trabalhando como zelador, e interpretado por Guy Boyd. Todo o filme, em resumo, é esse homem velho e sozinho imaginando como teria sido sua vida se tivesse amado, falado, sentido, ouvido e se emocionado. Os pais são recriações a partir de sentimentos do personagem. A namorada é um amontoado de desejos, pensamentos. É uma mistura. A casa, assim, serve de porta de entrada à sua imaginação, é a chance de viver o que não foi vivido. No porão, enquanto isso, guarda todo o seu “sujo” inconsciente. Em suma, é um mergulho na mente desse homem afetado pela vida solitária, moribundo tal qual o porco sendo comido por larvas no chiqueiro. É a história mais esperada vinda desse cinema “kaufmaniano”, que desperta o mais triste, profundo e sombrio de cada um dos nós, humanos.

Finais alternativos

Por fim, o mais legal para notar esse tom do cineasta é comparar o final do livro homônimo de Ian Reid e o final do longa-metragem de Kaufman. Na obra literária, há várias passagens (nunca mostradas no filme) de dois rapazes conversando sobre um acontecimento trágico ocorrido na escola.
Na casa dos pais, cada canto é um pedaço da cabeça de Jake (Crédito: Divulgação/Netflix)
Lá pro final, quando o texto ganha impulso, sabemos que foi Jake — na figura, novamente, do velho zelador. Com traços de esquizofrenia, ele mistura realidade e imaginação. Não consegue mais separar um elemento do outro. Com isso, acaba se matando com um cabide em um armário. Enquanto isso, no filme, Kaufman é mais sutil. Trabalhando com uma erupção que surge aos poucos, quase sem avisar, não há morte, não há cabide, não há sangue. O diretor apenas coloca Jake, já idoso, pelado, andando pela escola, enquanto segue um porco de animação moribundo. Não sabemos se ele morre. Vemos apenas um musical, inspirado em ‘Oklahoma!’, que se desembrulha na tela como o último espaço que há pra entrar na mente do protagonista. Para Kaufman, não importa o corpo. Apenas a mente. E, nesse ponto, já estamos totalmente imersos.
Matheus Mans

Jornalista especializado em cultura e tecnologia, com seis anos de experiência. Já passou pelo Estadão, UOL, Yahoo e grandes sites, sempre falando de cinema, inovação e tecnologia. Hoje, é editor do Filmelier.

Escrito por
Matheus Mans

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