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Mesmo com problemas, ‘Quem Vai Ficar com Mário?’ mostra diversidade em tempos modernos

A comédia italiana ‘O Primeiro que Disse’ se tornou um sucesso inesperado de público e crítica, em 2010, ao contar a história de um rapaz que precisa se assumir gay para a família conservadora. Era uma representação leve e despreocupada do ato de “sair do armário” em uma Europa que começava a trazer diversidade para o centro das discussões.

Agora, onze anos depois, a produção italiana ganha uma roupagem verde e amarela no remake ‘Quem Vai Ficar com Mário?’. Dirigido por Hsu Chien (de ‘Ninguém Entra, Ninguém Sai’), o longa-metragem, que acaba de chegar aos cinemas brasileiros, parte da mesma ideia: um rapaz (Mário, interpretado por Daniel Rocha) que quer assumir a sua sexualidade para a família, dona de uma cervejaria no sul do país.

Cena da comédia nacional ‘Quem Vai Ficar com Mário?’, com Daniel Rocha no elenco (Crédito: Divulgação/Downtown)
“Quando eu vi o filme original pela primeira vez, imaginei que daria uma adaptação maravilhosa. Mas tem muitas questões culturais da Europa que exigiram mudanças, pensando no respeito, na aceitação”, diz Chien, em coletiva de imprensa. “O filme tem uma mensagem que queremos no país. É possível mudar. Só abrir o coração e respeitar a escolha do próximo”.

Mudanças em ‘Quem Vai Ficar com Mário?’

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Durante a coletiva de imprensa, quem revelou mais os bastidores da produção foi Nany People — que interpreta uma amiga do protagonista e que engata um delicioso e inesperado par romântico. Ela conta que, inicialmente, não aceitou o papel. Segundo ela, não gostou da forma que o longa-metragem terminava, nem de algumas piadas existentes no roteiro, que foram reescritas. Agora, a produção aponta para caminhos interessantes. Fala sobre bissexualidade, poliamor e aceitação sem tabus. A última cena de ‘Quem Vai Ficar com Mário?’, principalmente, traz algumas questões interessantes e que devem suscitar debates entre o público — além de possibilitar que as pessoas abram as mentes. Mostra que a sexualidade é algo fluído.
“Eu chorei muito vendo o filme com a delicadeza que a história é contada. Não só para o público gay, mas para quem não é e para quem quer ser”, diz Nany People. “Mostra que não importa como você é, mas como você age. É algo que me diz muito respeito. Minha mãe me falou que eu poderia ser quem eu quisesse. Só tinha que ser digna. Chorei de emoção”. Daniel Rocha é conhecido, geralmente, por personagens mais durões, bem diferente do que apresentou em ‘Quem Vai Ficar com Mário?’ — como pode ser visto em ‘Sequestro Relâmpago’, por exemplo. Segundo ele, a sua grande preocupação ao gravar o filme com Hsu Chien era ter cuidado na criação do personagem evitando preconceitos e estereótipos, por exemplo. “O filme é um divisor de águas. Hsu falou que muita coisa ia mudar. Dei uma risada quando disse isso. Mas o filme não estava pronto, não tinha noção do que estava fazendo. Depois que assisti, percebi que ele tinha razão”, diz. “Pessoas que já acompanhavam meu trabalho podem ver que estou fazendo outra coisa. Se tiver ‘Mário 2’, contem comigo no elenco”.

Tabus e polêmicas

Apesar dos toques de Nany People, e que ajudaram o filme a se tornar muito mais moderno e antenado com o que está acontecendo na comunidade LGBTQIA+, ainda é possível notar algumas derrapadas na produção. Rocha, apesar de ter se esforçado em ficar longe de estereótipos, acaba apresentando algumas representações forçadas.
Nany People é um dos destaques do elenco da comédia brasileira (Crédito: Divulgação/Downtown Filmes)
Em determinado momento, por exemplo, está treinando no espelho como falar para o pai que é gay. Ali, tem uma representação preconceituosa de como homens homossexuais falam — mesmo com o personagem escapando desse tipo de representação o tempo todo. Parece um tique do diretor para fazer com que o público heterossexual dê algumas risadas. Depois, há o problema do final, que passa a ideia de que a sexualidade é uma escolha. Mas, a “opção sexual” já é algo mais do que ultrapassado. Por fim, há o fato de que dois atores heterossexuais interpretam os dois personagens gays principais — no caso, Daniel Rocha e Felipe Abib. Enquanto isso, atores e atrizes da comunidade LGBTQIA+ ficaram com os papéis secundários, como é o caso de Letícia Lima e Nany People — mas é bom lembrar que Chien, o diretor, também é da comunidade. Na coletiva de imprensa, ele se justificou. “Sou um cineasta LGBT e com uma trajetória de filmes da comunidade LGBT. Cada projeto é um projeto”, diz. “Todos os atores neste filme, sem exceção, vieram do amor que tenho por seus trabalhos. Queria trabalhar com pessoas que eu amo, que eu admiro. Continuo atento ao lugar de fala, mas foquei em pessoas que eu queria trabalhar. Queria pessoas que eu poderia abraçar”.

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Matheus Mans

Jornalista especializado em cultura e tecnologia, com seis anos de experiência. Já passou pelo Estadão, UOL, Yahoo e grandes sites, sempre falando de cinema, inovação e tecnologia. Hoje, é editor do Filmelier.

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