Crítica de ‘Resistência’: um filme que tem medo de ser ficção científica Crítica de ‘Resistência’: um filme que tem medo de ser ficção científica

Crítica de ‘Resistência’: um filme que tem medo de ser ficção científica

Gareth Edwards até tem competência na criação visual desse novo mundo, mas não tem personalidade para uma história realmente complexa

Matheus Mans   |  
27 de setembro de 2023 10:00
- Atualizado em 23 de setembro de 2023 11:22

É um tanto quanto irônica a estreia de Resistência nesta quinta, 28, em meio a greve dos atores e roteiristas. Afinal, um dos principais pontos levantados pelos grevistas é como a inteligência artificial é uma ameaça para o trabalho de suas categorias – coisa que estúdios, porém, enxergam com positividade. Enquanto isso, o filme de Gareth Edwards (Godzilla, Rogue One) trata do tema de uma perspectiva inusitada: as IAs como seres injustiçados.

Qual é a história de Resistência?

O mundo está colapsado nessa realidade. Estados Unidos fazem guerra contra a chamada Nova Ásia – o que não é bem explicado, mas parece uma união (ou seria conquista?) de vários países do continente oriental a partir de um prisma bastante chinês. EUA querem banir a inteligência artificial, vista como o mal do mundo, enquanto a Ásia quer manter os robôs vivendo em sociedade. É aí que entram os dois protagonistas: Joshua e Alphie.

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Ele (John David Washington) é um soldado americano infiltrado na Nova Ásia que perde tudo quando uma missão dá errado – perde, principalmente, seu amor inesperado, Maya (Gemma Chan). Vê sua vida acabar. Até que ele encontra Alphie (Madeleine Yuna Voyles), essa garotinha criada em inteligência artificial, que possui poderes inacreditáveis, assim como uma empatia inesperada para um ser de metal, programação e parafusos. Joshua, como diz a Bíblia, é a salvação. Mas a salvação de quem? Dos vivos ou dos robôs?

Alphie é o ser que une dois mundos (Crédito: 20th Century Studios)

E é aí que entra o grande debate de Resistência, e que vai por um caminho diferente do que está sendo amplamente discutido hoje: inteligências artificiais não devem ser tratadas com respeito e dignidade? Será que não merecem um espaço na sociedade? São vivos?

A beatificação da inteligência artificial

Edwards, que assina o roteiro ao lado de Chris Weitz (também de Rogue One), se afasta da inteligência artificial e da tecnologia avançada malignas, vista em filmes como RoboCop e Exterminador do Futuro, para algo mais acalentador, como em A.I.: Inteligência Artificial ou até mesmo em Alita: Anjo de Combate. Em Resistência, robôs são maternais, se preocupam e podem até ser monges tibetanos – ou seja, repletos de vida e espiritualidade.

Obviamente, há um contexto metafórico dentro dessa proposta de Edwards. Fala muito sobre militarismo norte-americano, sobre narrativas e, principalmente, sobre domínio – são inúmeros os paralelos que podem ser traçados entre a trama e a Guerra do Vietnã, por exemplo. Tudo isso embalado também por algo que o cineasta faz muito bem: um visual marcante e impactante, que ajuda a construir a noção desse mundo novo criado aqui.

O problema é que a narrativa não avança como deveria. Dá voltas e voltas em si própria, como se a metáfora – e a sacada de transformar os robôs em meras vítimas – fosse o bastante para fazer com que Resistência avance. Não é. O filme rapidamente se torna cansativo, inchado, pesado. Edwards parece que não sabe como avançar na discussão. Ao invés de focar na humanidade da ficção científica, foge o tempo todo do gênero.

Em Resistência, uma grande máquina paira os ares matando os inimigos (Crédito: 20th Century Studios)

Edwards incha o roteiro com muito drama (a morte da esposa, a solidão de Alphie), ação (a busca desenfreada por Joshua pela militar interpretada por Allison Janney) e até mesmo a pitada de romance que nasce do amor do personagem de David Washington pela de Chan. Isso sem falar do caos geográfico do filme, que não consegue estabelecer as regras exatas desse novo mundo e deixa tudo mais confuso. É um filme que não sabe se situar nunca.

Resistência: uma mistura de tudo

O filme rapidamente se torna chato, cansativo, e o pior: toda essa narrativa sobre americanos versus asiáticos acaba dando espaço para algo mais pobre, sobre essa possível injustiça cometida contra os robôs. Sério que isso é o melhor a ser dito bem agora?

Falta personalidade para o cineasta encontrar o coração, a verdade de sua história. Não à toa, Resistência parece, muitas vezes, uma colagem de vários filmes de ficção científica – RoboCop, Exterminador do Futuro, A.I.: Inteligência Artificial, Alita e, é claro, Blade Runner, que se torna logo de cara, nos primeiros dez ou quinze minutos, a referência mais óbvia.

Resistência poderia ser um grande filme. No entanto, parece não ter personalidade para tornar o debate mais complexo, transformando um roteiro difícil em algo plano, raso, sem muita intensidade. É praticamente bem contra o mal o tempo todo, sem nunca buscar as texturas que nascem a partir das complicadas relações humanas e artificiais. Uma pena, já que, em camadas mais profundas, poderíamos encontrar um grande filme por aqui.

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