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‘Sonic 2’ borra ainda mais os limites entre cinema e produto de consumo

‘Sonic 2’, filme que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 7, é um longa bobinho, feito para crianças e para aqueles que são fãs do videogame. Perfeito para passar o tempo. Dá pra se divertir com Jim Carrey retornando como o Dr. Robotnik, enquanto as referências ao jogo são cada vez mais claras.

No entanto, ao longo das mais de duas horas de duração do filme, não parei de me questionar: quais os limites para que o cinema não seja um simples produto de consumo?

Os limites entre cinema e produto de consumo já começaram a ser borrados no primeiro filme da franquia, quando o visual inicial do ouriço azul foi revelado. Ele tinha uma forma humanoide, pouco cartunesca, e um rosto desproporcional. Provocou revolta nas redes. Jeff Fowler, o diretor da empreitada, abaixou a cabeça e disse amém. Anunciou que ‘Sonic’ iria atrasar, já que decidiram refazer o visual para ficar de acordo com o desejo do público.
Desde seu embrião, ‘Sonic’ era um filme preocupado em agradar o público (Crédito: Divulgação/Paramount Pictures)

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Foi a primeira vez que a franquia causou essa reflexão. Fowler, afinal, deixou a visão estética de uma equipe para trás em prol da alegria de fãs pelo mundo. Não batalhou em momento algum pelo que o time criativo queria. Apenas aceitou a derrota e, em busca de uma bilheteria mais gorda, aceitou fazer como os fãs queriam – colocando mais estimados US$ 5 milhões de gastos no orçamento. Corre a conversa de que tudo isso foi golpe de marketing. Nunca foi provado. Se foi mesmo, apenas valida a tesa do produto de consumo. Com isso, ‘Sonic’ foi um sucesso. Fez mais de US$ 300 milhões de bilheteria, se tornou a segunda maior bilheteria de 2020 e o filme se tornou a adaptação de videogame de maior abertura doméstica, ultrapassando ‘Detetive Pikachu‘.

E ‘Sonic 2’?

‘Sonic 2’ chega aos cinemas, então, com esse histórico. Teve um primeiro filme que foi sucesso absoluto de bilheteria após os seus criadores aceitarem fazer uma mudança exigida pelo público. Como repetir o agrado? O grande ponto é que a Paramount Pictures não quis arriscar. E assim como uma marca de carro faz modelos parecidos, mas com melhorias estéticas pontuais para cobrar mais caro, ‘Sonic 2’ se revela apenas como uma versão superlativa de ‘Sonic’. A história é a mesma: Sonic defendendo a Terra e humanos amados de ameaças inexplicáveis, focadas em destruir o próprio ouriço azul. Como diferença, Fowler, que retorna para a cadeira de diretor da franquia, traz Tails como o parceiro do ouriço azul na defesa do planeta Terra — e de algumas relíquias de sua espécie. Contra quem? Não só contra Robotnik (Jim Carrey), mas agora também contra Knuckles, membro de um clã inimigo de Sonic.
Ou seja: ao invés de um herói, agora são dois. Ao invés de um vilão, dois. Além disso, a maioria dos personagens humanos são jogados de escanteio, principalmente Tom (James Marsden), sem qualquer importância dentro da história que é contada, e até mesmo o divertido Agente Rocha (Lee Majdoub) que, no primeiro filme, serviu como um boa escada para Carrey em cena. Há uma clara preferência em mostrar mais as criaturinhas do que humanos. Com isso, não há criatividade ou desejo de avançar com a história. ‘Sonic 2’ é basicamente uma cópia, um copia e cola da história do primeiro longa-metragem, com uma estrutura semelhante — as ameaças são as mesmas, assim como os estranhamentos e a mensagem sobre amizade e família acima de tudo. Há até incoerências sobre elementos da cultura de Sonic que surgem só agora, sendo que já deveriam ter sido revelados, pela lógica, já na primeira história. Isso sem falar de cenas que são claras propagandas. Enquanto o primeiro fez isso apenas com o restaurante Olive Garden, este segundo vai além, com referências à marcas como Oreo e uma montadora de veículos. Tudo na cara. ‘Sonic 2’ é apenas superlativo em relação ao primeiro, com limitações criativas escancaradas e sem desejo de ser mais. É o típico filme de produtor, sem qualquer ponto criativo de interesse. Deve agradar as crianças, ainda mais por conta da infantilização de muitos trechos, e aqueles fãs mais ávidos da franquia de videogames, que vão se empolgar com referências e momentos marcantes da história. E aí vem a questão: ‘Sonic 2’ é mais arte ou produto de consumo?

Cinema é arte. Ou não?

Não é ‘Sonic’, obviamente, que está inaugurando esse questionamento. A fórmula Marvel está aí, acontecendo desde 2009, enquanto a Warner Bros. explora seus produtos até a última gota, como é o caso de ‘Harry Potter’ e a franquia ‘Animais Fantásticos’. Mas ‘Sonic 2’ talvez seja um dos casos que deixa esse tom automático evidente. Não há nada de novo, não há nada de criativo. É a mesma história sendo recontada de uma forma diferente, de olho na bilheteira.
O aguardado embate entre Sonic e Knuckles é um dos destaques de ‘Sonic 2’ (Crédito: Divulgação/Paramount Pictures)
Mas cinema é arte. Ou não mais? Apesar dessa definição andar na corda bamba nos últimos anos, dá para encontrar momentos de encantamento, reflexão ou provocação em vários filmes: desde a cena em que todos personagens da Marvel se reúnem em ‘Vingadores: Ultimato‘, passando pela reviravolta de ‘Corra!‘, esbarrando no flashback final de ‘La La Land‘ e até chegar na reunião das três versões do Homem-Aranha. Tem emoção? É cinema. E ponto final. Não precisa ser um filme obscuro ou absolutamente experimental para se encaixar nessa definição arranhada e combalida. Nem precisa ser um bom filme. Só precisa ter algum sopro de inovação, um sopro de empolgação com essa história. E ‘Sonic 2’ não tem isso em momento algum. São apenas apostas para agradar fãs, vender produtos e fazer bilheteria, pensando no agrado dos fãs. O que nos aguarda em ‘Sonic 3’? Três vilões contra três heróis? Arte, obviamente, pode ser também um produto de consumo. As duas coisas não se contradizem. No entanto, é preocupante quando a finalidade de um filme não é provocar, instigar, refletir ou emocionar. É a mesma preocupação que surge quando assistimos a ‘Space Jam: Um Novo Legado‘, que parece um filme de algoritmo apenas focado em achar mais público, mais assinantes. Enfim: será que podemos ficar confortáveis com uma cinema assim?

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Matheus Mans

Jornalista especializado em cultura e tecnologia, com seis anos de experiência. Já passou pelo Estadão, UOL, Yahoo e grandes sites, sempre falando de cinema, inovação e tecnologia. Hoje, é editor do Filmelier.

Escrito por
Matheus Mans

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