Além do Afeganistão: filmes sobre o terrorismo no Oriente Médio

Baseado no livro de mesmo nome - por sua vez, levemente inspirado na vida do autor, Khaled Hosseini -, o longa começa com uma visão quase onírica da vida no Afeganistão na década de 1970. Porém, aos poucos, a realidade vai se impondo, tendo como pano de fundo a queda da monarquia em 1973, o golpe de estado em 1978, a invasão soviética de 1979 e, por fim, a ascensão do Talibã. Dessa forma, tanto metaforicamente quanto literalmente, a história nos ajuda a entender o contexto que levou o país ao cenário que temos hoje. Ainda que seja uma produção dos EUA, a versão cinematográfica é uma adaptação decente do livro, mesmo que omitindo passagens que ajudem a compreender melhor a transformação na sociedade afegã. [-]

‘O Orfanato’ é um outro filme que retrata as transformações afegãs a partir dos anos 1970. Na história encontramos um garoto de 15 anos que, ainda no regime soviético no Afeganistão, decide ganhar a vida vendendo bilhetes de cinema como cambista. As coisas mudam de figura na vida do rapaz, porém, quando ele é pego e enviado para um orfanato estadual. É lá, então, que suas fantasias com o cinema de Bollywood são essenciais para o rapaz enfrentar valentões, novas amizades e romances. Assinado por uma diretora do país, Shahrbanoo Sadat, vemos em detalhes as influências da cultura local pré-ascensão do Talibã e os efeitos da invasão soviética. [-]

Dirigido pelas estreantes em animações Zabou Breitman e Eléa Gobbé-Mévellec, o longa-metragem coloca leveza na realidade da Cabul, a capital do Afeganistão, ocupada pelos talibãs nos anos 1990. Histórias de amor e desamor se amontoam, mostrando como as realidades e comportamentos se adequam e tentam encontrar saídas em tempos difíceis. É um drama de animação potente, coeso e que deve deixar o estômago embrulhado ao pensar nas possibilidades e restrições que esse povo viveu em meio ao caos, mortes e violência. Um filme para sentir e refletir, que traz a visão do povo em um dos momentos mais sombrios do país. [-]

Outro longa-metragem que traz o Afeganistão durante o primeiro período de domínio do Talibã. Esse, no entanto, traz o olhar para a opressão sofrida pelas mulheres durante o regime. A protagonista é Parvana, uma garota que vê o pai preso de forma injusta - e que é obrigada a se vestir como menino para trabalhar e sustentar a família. Para ver e engolir seco enquanto lembramos que essa, infelizmente, está voltando a ser a realidade de todo o povo (e, principalmente, das mulheres) no país. [-]

O diretor franco-canadense Denis Villeneuve ('Duna') acrescenta a sua perspectiva para os dramas vividos no Oriente Médio, a partir de uma adaptação da peça de mesmo nome escrita por Wajdi Mouawad - que saiu do Líbano após o início da Guerra Civil no país. Em 'Incêndios', dois irmãos árabes que migraram para o Canadá descobrem a existência de um irmão e que o pai (que acreditavam estar morto) continua vivo, e resolvem voltar para a sua terra natal, A partir disso, duas narrativas são construídas: uma sobre os irmãos em busca de se reconectar com suas origens, e a outra com a história sofrida da mãe - em meio à guerra, abusos e traumas. Assim como em 'O Caçador de Pipas', a trajetória do irmão mais velho e da mãe é, mais do que qualquer coisa, uma grande representação aos sofrimentos do povo no Oriente Médio. [-]

Em 2012, o diretor e premiado documentarista Hernán Zin sofreu um incidente no Afeganistão que o marcou para sempre. Em busca de respostas, Zin entrevista outros jornalistas em uma experiência que mergulha o público nas profundezas do horror. Reorientando seu desejo de conhecer a verdade sobre o que aconteceu com ele, ‘A Vida Pela Notícia’ trata com cuidado os testemunhos, evitando fabricações ou compaixão excessiva, encontrando um ponto de equilíbrio entre as vítimas da guerra, os jornalistas e seus espectadores. Seus pensamentos ao longo das filmagens estão com as crianças, que inspiram uma rejeição particular à guerra. É uma visão mais jornalística para as dores da população durante a Guerra do Afeganistão, período marcado pela invasão e presença dos EUA no país. [-]

Chris Hondros foi um dos mais renomados fotojornalistas da imprensa americana, vencedor de dois prêmios Pulitzer e conhecido por retratar a presença dos EUA em guerras no Oriente Médio. Pelo olhar do jornalismo, podemos ver a presença não só do exército americano, mas também dos combatentes locais e o sofrimento daqueles pegos no meio do conflito. O documentário não só traz tudo isso, mas também serve como tributo a Hondros, morto por forças governamentais da Líbia durante a Guerra Civil do país, em 2011. [-]

‘Notturno’, do famoso documentarista Gianfranco Rosi, mostra a dura realidade das pessoas que vivem em meio aos conflitos do Oriente Médio. As imagens foram capturadas ao longo de anos nas regiões do Irã, Curdistão, Síria e Líbano. O documentário é surpreendente pois mostra o quão pesado é viver neste ambiente em contraponto com quem se acostumou com essa realidade. ‘Notturno’ é uma produção naturalista, sem narração ou músicas que tentam provocar reações no espectador, e esse é dos maiores méritos de Rosi. [-]

‘Os 23: Prisioneiros no Iraque’, como o título entrega, narra a história de 23 soldados iranianos (todos entre 13 e 17 anos) que foram capturados pelo exército do Iraque na guerra entre os dois países, em 1961. A produção tem um formato documental e usa os dois personagens principais, Ahmad Yousefzadeh e Mullah Saleh, para construir a narrativa. Há, também, o uso de imagens de arquivos, com a presença de todos os prisioneiros. Dessa forma, compreendemos melhor como a juventude das pessoas é roubada pela guerra - e os reflexos disso em uma sociedade traumatizada. [-]

Em 2019, ano de lançamento deste documentário, a Guerra Civil Síria havia completado oito anos, deixando milhares de civis mortos, milhões de refugiados e inocentes pegos no fogo cruzado, lutando todos os dias contra as adversidades brutais do guerra. Essa realidade pode muitas vezes parecer distante devido aos nossos fatores políticos, geográficos e culturais. Por isso, 'Para Sama' é o tipo de documentário que se distancia dessas diferenças para falar de sentimentos universais: medo, sofrimento e sacrifício; mas também de esperança, compaixão e vontade. Narrado pela jornalista e cineasta Waad Al-Kateab - que raramente largou a câmera durante todos aqueles anos - o documentário é um testemunho brutal da crise humanitária na Síria, da experiência feminina da guerra e uma carta de amor de uma mãe à sua filha. Indicado em 2020 ao Oscar de melhor documentário e vencedor na mesma categoria do BAFTA, 'Para Sama' é uma experiência que transforma e da qual você vai se lembrar pelo resto da vida. [-]

Jafar Panahi é um dos mais renomados diretores do cinema do Irã - esse, por sua vez, elogiado mundialmente. Engajado em causas sociais e políticas em seu país, Panahi foi preso pelo regime de Ali Khamenei e, posteriormente, proibido de filmar e de sair do território iraniano. Isso não o impediu de continuar fazendo cinema, ainda que de forma clandestina - e ‘Táxi Teerã’ é um grande exemplo disso. Para contornar a proibição, o diretor conduz um táxi pelas ruas da capital enquanto retrata o dia a dia da população e a sua cultura. Não só um reflexo da guerra cultural, mas também uma forma de dar rosto e voz ao povo. [-]