Crítica: 'The Last of Us' tem tudo para ser a nova série evento da HBO
Com um episódio de estreia grandioso, 'The Last of Us' vem para acabar com a má reputação de adaptações de videogames
Neste domingo, dia 15 de janeiro, a HBO lançou o primeiro episódio da aguardada série 'The Last of Us'. Trata-se de uma adaptação do jogo de videogame de mesmo nome da desenvolvedora Naughty Dog, extensamente premiado e aclamado por crítica e público.
O Filmelier assistiu à estreia de ‘The Last of Us’ e afirmamos: mesmo com as expectativas altíssimas, o primeiro episódio, ‘Quando Estiver Perdido na Escuridão’, conseguiu superá-las, nos deixando ainda mais ansiosos para os próximos capítulos. E provando de uma vez por todas que, quando o formato é compreendido e empregado cuidado no projeto, podem sair ótimas adaptações de videogames. Confira abaixo nossa crítica e nosso “recap” do episódio.
'The Last of Us' já foi renovada para a 2ª temporada e está disponível na HBO e HBO Max – saiba aqui como assistir online e com opções gratuitas. Aproveite para ler também as críticas semanais do Filmelier dos episódios de 'The Last of Us':
- ‘The Last of Us’: episódio 2 da série tem cenas de terror e reviravolta “soco no estômago”
- ‘The Last of Us’: episódio 3 tem cenas inéditas, tom romântico e dramático
- ‘The Last of Us’: episódio 4 é menos impactante, mas aprofunda a narrativa
- ‘The Last of Us’: episódio 5 prova que a série não está para brincadeira
- ‘The Last of Us’: episódio 6 tem encontro aguardado e “momento família”
- ‘The Last of Us’: episódio 7 revela como Ellie foi mordida
Sobre o que é ‘The Last of Us’?
Tal como a série da HBO, o jogo narra a história de Joel e Ellie, sobreviventes em um apocalipse infeccioso que causa em suas vítimas comportamento violento e canibalístico similar ao de zumbis, com a diferença de que a doença é transmitida por um fungo, desenvolvendo o "ecossistema" da doença de forma mais complexa e elaborada. O grande destaque do videogame, porém, é o foco nas relações humanas, com uma narrativa dramática emocionante e personagens muito bem construídos, multifacetados e carismáticos.
Por sua grande aclamação e história emocionante, o jogo construiu uma base ampla de fãs. Muitos interessados acompanharam o jogo através de gameplays, e a tempos a história furou a bolha do público restritamente gamer. Assim, não foi nenhuma surpresa a grande expectativa gerada em torno da série quando foi anunciada em 2020 sob o comando de Craig Mazin, também criador da aclamada ‘Chernobyl’, e de Neil Druckmann, o próprio criador do jogo. A expectativa só aumentou com o anúncio de Pedro Pascal ('The Mandalorian') como Joel Miller e Bella Ramsey ('Game of Thrones') como Ellie.
Estreou então o primeiro episódio da série tida como mais aguardada do ano. A HBO estava travando durante a transmissão, como já é de costume em grandes lançamentos. Hoje, dia 16 de janeiro, a série já conta com 15 mil avaliações no IMDb, e uma média de 9,6/10. No Rotten Tomatoes, a média de aprovação da crítica é 99% com certificado e 93 avaliações, e uma média de público de 96%, com quase duas mil avaliações até o momento. Não à toa que a 'The Last of Us' teve uma das maiores estreias de séries originais da HBO.
Primeiro episódio de ‘The Last of Us’ é muito fiel ao videogame
O primeiro episódio, intitulado ‘Quando Estiver Perdido na Escuridão’, tem 80 minutos de duração, e adapta aproximadamente a primeira hora do jogo. Algumas perspectivas que já ficaram claras nesse começo – e estabelecendo uma comparação entre série e videogame – é que a série tem um controle perspicaz de que aspectos manter e o que alterar. Muito fiel ao material de base, mas ao mesmo tempo funcionando como uma expansão da obra, ‘The Last of Us’ da HBO não fica limitada e transmite o sentimento do jogo de maneira natural, sem soar forçado. Seguimos o texto com alguns pequenos spoilers.
Atenção: o texto a seguir contém pequenos spoilers. Continue por sua conta e risco.
Pandemia de ‘The Last of Us’ começa com um fungo, e uma tensa comparação com o mundo real
A cena inicial já é exclusiva da série, uma espécie de epígrafe visual. Em 1968, durante um “talkshow”, um cientista discorre sua preocupação com microorganismos e a possibilidade de uma pandemia, no entanto, em sua opinião bactérias ou vírus não são as fontes de transmissão que o assustam, mas sim os fungos.
"Fungo. O fungo parece inofensivo, outras espécies discordam. Alguns fungos não buscam matar, mas controlar. [...] Os vírus nos adoecem, mas os fungos podem alterar nossa mente. Há um fungo que infecta insetos. Pode entrar em uma formiga, percorrer o sistema circulatório dela, ir até o cérebro e enchê-lo de alucinógenos, controlando a mente da formiga. O fungo dita o comportamento dela, aonde ir e o que fazer, como um manipulador de fantoches. E fica pior. O fungo deve se nutrir, então devora o hospedeiro a partir de dentro e vai ocupando espaços. Mas não deixa a vítima morrer, não. Ele mantém o fantoche vivo ao impedir a decomposição. [...] Os fungos não sobrevivem se a temperatura interna do hospedeiro for maior que 35 °C. Atualmente não há motivo para evoluírem e suportarem mais calor, mas e se isso mudasse? E se por exemplo, o mundo ficasse um pouco mais quente?[...]", diz o especialista.
A reação do público do “talkshow” é a mesma dos espectadores: silêncio absoluto ao contemplar a morbidez da ideia, apresentada de forma sucinta e aterrorizante. O pequeno trecho é o suficiente para situar o espectador exatamente do que esperar da série, e a breve análise fica marcada na cabeça, garantindo o senso de perigo.
Abertura de ‘Game of Thrones’ dá de 10 a 0 na de ‘The Last of Us’
Em seguida temos a abertura, um tema sombrio com uma sonoridade que paira entre 'Game of Thrones' e 'Breaking Bad' e, junto com os créditos, imagens de fungos se espalhando. Não é uma abertura ruim, mas se há algum ponto a ser criticado da série, com certeza é a abertura. Soa genérica e não oferece muito sobre a série, é o tipo de abertura que dá vontade de pular. Relembre a abertura:
- Confira também: ‘House of the Dragon’: O que esperar da 2ª temporada do spin-off de ‘Game of Thrones’?
Pequenos detalhes tornam o prólogo essenciais para a narrativa da série
O jogo é situado em 2013, fato que na série é alterado para 2003 – escolha feita para localizar a parte principal da narrativa próximo ao presente, em 2023. O prólogo dura aproximadamente 30 minutos, algum tempo a mais do que no videogame. O tempo extra é bem vindo: a introdução aproveita para nos situar com Joel e sua filha Sarah (interpretada por Nico Parker, filha da atriz Thandie Newton) e o irmão mais novo de Joel, Tommy (por Gabriel Luna).
Acompanhamos um dia na vida dos três, é aniversário de Joel e ele e o irmão precisam trabalhar um turno extra. Sarah iria fazer panquecas, mas o pai não comprou a massa. Mais tarde, ela visita seus vizinhos que oferecem biscoitos, mas ela recusa. Nesse meio tempo, o público é apresentado a pequenas insinuações de que algo está acontecendo, como uma notícia no rádio, jatos passando ou uma movimentação ao fundo. Joel volta pra casa tarde e não traz um bolo, como havia prometido para sua filha. Estes pequenos detalhes do bolo, a panqueca e os biscoitos são essenciais, pois uma das formas de proliferação do fungo é pela farinha. Inconscientemente evitando esses alimentos, o trio não foi infectado.
Início de ‘The Last of Us’ é imersivo e eletrizante como um videogame
À noite, Tommy é levado para a delegacia por uma briga no bar, o irmão vai atrás dele. Sarah acorda no meio da noite com barulhos esquisitos, se depara com uma chamada de emergência nacional. Na rua, o caos começa a se instaurar, e nesse momento temos uma das sequências mais interessantes do episódio.
Joel e Tommy chegam ao mesmo tempo, alarmados pelo caos. Pegam a menina e iniciam uma fuga de carro, em meio à confusão generalizada que se instaura. Esse momento é eletrizante: de dentro do carro, o espectador acompanha a narrativa de forma muito imersiva, como se fosse o próprio videogame, e a cada segundo a tensão aumenta e as dimensões do desastre ficam mais perceptíveis. Em dado momento, uma grande explosão acontece, causada pela queda de um avião, e o carro, mesmo a uma grande distância, capota. No jogo, a explosão é de um posto de gasolina, mas o avião com certeza deixa a cena ainda mais intensa e assustadora.
Sem carro e em meio ao caos, Tommy se separa de Joel e Sarah, que machucou o pé. O que nos encaminha para o momento mais forte do episódio (grande spoiler à frente): ao serem perseguidos por um infectado, um militar trajado de máscara de proteção os intercepta e atira na ameaça. Logo em seguida, porém, recebe ordens para atirar nos dois, para prevenir uma possível infecção. Joel tenta pedir misericórdia, mas eles são alvejados. Tommy aparece e os salva, mas Sarah foi atingida e não sobrevive. Esta cena é extremamente marcante na série. Beneficiada pelo tempo maior de tela que a personagem recebe, nos permite criar afeição por ela, fazendo assim com que o momento da morte seja emocionante e pesaroso – além de ser um ponto essencial para a trama, pois o luto e a dor de Joel são grandes motivadores do personagem ao longo da narrativa.
Episódio apresenta o tom frio e os horrores da sociedade pós-infecção
A partir de então somos situados no presente, 20 anos depois do surto de contágio. A narrativa assume um tom trágico e frio, algumas cenas demonstram os horrores da sociedade pós-infecção e personagens são apresentados, como Tess (interpretada por Anna Torv, de 'Mindhunter'), parceira de contrabando de Joel. Pelas conversas descobrimos que Tommy está desaparecido há algumas semanas, e Joel está em busca de uma bateria de caminhão para ir atrás dele. Aqui se estabelece mais uma diferença notável entre jogo e série: a relação dos irmãos. Enquanto no jogo os dois são mais afastados, pois Tommy se uniu a um grupo rebelde chamado de Vaga-Lumes, a série dá a entender que os dois têm uma relação muito próxima ainda, com Joel motivado a buscá-lo. Uma camada a mais para o personagem, que no jogo é tratado de forma mais fria nesse aspecto.
Como Joel conhece Ellie em 'The Last of Us'?
A negociação pela bateria dá errado, porém, quando Joel e Tess tentam confrontar o fornecedor, acabam se deparando com Marlene, a líder dos Vaga-Lumes, e uma menina mantida cativa por ela, Ellie. A resistência planeja mover Ellie para um lugar afastado, para mantê-la em segurança – por um motivo deixado nas entrelinhas. Marlene e Joel negociam e, assim, ele e Tess acabam assumindo a responsabilidade pela garota, finalmente unindo o caminho dos dois protagonistas. Esta cena acontece um pouco mais cedo do que no jogo, com algumas diferenças no que encaminha esse encontro. Em um embate no fim do episódio, Joel e Tess descobrem que Ellie está infectada, mas o fungo não se desenvolveu nela mesmo depois de três semanas, motivo que leva a resistência a acreditar que ela é imune e, assim, extremamente valiosa.
Considerações Finais: ‘The Last of Us’ é bom?
O episódio é maravilhoso. Ele prende os espectadores durante seus 80 minutos com um crescente na tensão que nos deixa vidrados na tela. Várias sequências são impressionantes e, para quem conhece o jogo, é muito legal identificar as sequências que se desenrolam mais parecidas, até mesmo com alguns diálogos sendo reencenados.
Enredo é o ponto alto da série da HBO
Os aspectos técnicos são primorosos. Trilha sonora, fotografia e arte são um atestado da qualidade desta produção, com detalhes minuciosos e um cuidado notável. O ponto alto, no entanto, assim como no próprio jogo, é o enredo. Os personagens são naturais, carismáticos e não soam estereotipados, com uma construção rica e elaborada. O senso de urgência e perigo é latente, e o ritmo mantém a tensão contínua. Tudo isso é ressaltado pela qualidade das atuações, sem dúvidas.
Protagonistas de ‘The Last of Us’ entregam força e naturalidade
Pedro Pascal já se consagra como a escolha perfeita para o Joel, enquanto Bella Ramsey mostra carregar todas as características marcantes de Ellie. Mas não são só eles, obviamente. Todo o elenco de apoio se mostra em perfeita sintonia, desempenhando os papéis com força e naturalidade. Anna Torv também está estrondosa.
- Quer ler mais críticas de série? ‘House of the Dragon’ é ‘Game of Thrones’, só que com outro nome
Com tudo isso, as expectativas só crescem. O piloto realmente é tudo isso e, de fato, coloca a série no rumo para se consagrar como uma das melhores do ano, nos deixando extremamente ansiosos para o próximo episódio. O formato semanal com certeza beneficiará a série, incentivando o boca a boca e transformando o domingo à noite em um evento da melhor forma que a HBO sabe fazer. É emocionante ver uma adaptação tão cuidadosa e alinhada com o material original, que realmente enxerga sua essência e tem o esmero necessário para transferi-la para outra mídia, assim apresentando novamente essa grande narrativa para um público novo e muito maior.
Assista ao trailer dos próximos episódios de 'The Last of Us':
Miguel Possebon é formado em Comunicação Audiovisual pelo Centro Universitário SENAC-SP em 2021. Participou em vários projetos audiovisuais independentes em set e pós-produção, mas como apaixonado por cinema realmente gosta de trabalhar com conteúdo. No Filmelier faz curadoria, programação de conteúdo e é assistente de redação.
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